O que posso dizer desta cidade onde a aura de Neruda vagueia pelas ladeiras do cerro Bella Vista
O que posso dizer desta cidade onde o cheiro de maresia denuncia o porto ancorado no Pacífico
O que posso dizer desta cidade onde os marinheiros, após meses no mar, escolhem-na para seu hogar
O que posso dizer desta cidade que se insinua entre as colinas e se oferece aos pés do oceano
O que posso dizer desta cidade onde as gaivotas domesticadas pousam fotogenicamente diante das câmeras dos turistas
O que posso dizer desta cidade de casinhotas decrépitas e de espigões abastados elevando-se mais alto que seus cerros
O que posso dizer desta cidade que me indicou a rota certa por onde andar e me furtou a visão
O que posso dizer desta cidade de gentis moradores e impiedosos ladrões

O que posso dizer desta cidade, misto de Alfama, Santa Tereza e Boca
O que posso dizer desta cidade e de seus colossais guindastes, tais tentáculos de polvo, empilhando enormes containers uns sobre os outros no cais
O que posso dizer desta cidade e de seus coloridos e impacientes ônibus trafegando velozes através das ruas
O que mais posso dizer que já não foi dito e sussurrado pelos amantes indóceis se esfregando tesudos à beira mar
O que posso dizer desta cidade e de seus velhos bebuns de faces inchadas escutando boleros em decadentes botecos
O que mais posso dizer contra ti
O que mais posso dizer a teu favor
Um mistério a beira-mar? um calor tropical à tarde? um friozinho andino à noite?
Sei lá o que és, Valparaíso, talvez por isso tenhas sido a morada do poeta.
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