Acordo cedo no sábado, afinal, hoje é o dia de visitar as famosas Torres del Paine. Aqui do refúgio Torres tem-se uma visão linda da bela face sudeste do cerro Almirante Nieto, um pouco mais adiante estão as Torres Central e Norte, além dos Cerros Peineta e Nido de Condor. Tudo isto vejo agora sentada a uma mesa do refeitório degustando o meu desayuno de huevos revueltos, mingau, torradas, manteiga, geléia, suco, e chá com leite. Enquanto comemos, Daniel satisfaz minha curiosidade sobre os glaciares, esclarecendo que os há de dois tipos: os secos e os úmidos. Os primei
ros são extensões de gelo oriundos dos campos de gelo, enquanto os segundos são resultado da precipitação de neve sobre as montanhas como os que avisto sobre o cerro Almirante Nieto. Às 9 da manhã, tomamos a trilha que segue o vale Ascencio, ladeada, à esquerda pelo onipresente cerro Almirante Nieto com seus belos glaciares colgantes, e, à direita, do outro lado do rio, impõem-se outros cerros riscados de branco em seus flancos por canaletas de neve. A vegetação na beira da trilha é de matorrales, sendo encontrada no chão outra frutinha rasteira muito gostosa, o mirtilo, semelhante à chaura. Quando meus olhos se elevam pelas encostas dos cerros, a ausência de vegetação denuncia a coloração árida do deserto marginal de altura. Durante boa parte do trajeto até o refúgio Chileno sobe-se, sobe-se e sobe-se, nada de muito difícil, até porque ver e ouvir o rio Ascencio serpenteando lá embaixo, soa como música aos meus ouvidos. Atravessamos a pontezinha que cruza o rio e alcançamos a margem oposta onde se encontra o refúgio Chileno já fechado a esta época do ano. Sento-me num dos bancos que ficam atrás do refúgio e tiro a jaqueta, o esforço da subida, afinal f
oram mais de 2 horas de caminhada, se faz sentir. Aproveito e desço até o rio pra encher minha garrafa com a água que sinto geladinha através do plástico do recipiente. Após o refúgio Chileno, entra-se nos bosques magalhânicos, um lugar de conto de fadas, onde imperam as lindas faias cujas folhas já exibem a coloração amarelada, típica do outono, pedaços de troncos de árvores servem de pontilhões para se atravessar os córregos de espumantes águas cristalinas que sulcam o terreno coberto de folhas, galhos de árvores caídos no solo formam bizarras esculturas naturais. O rio Ascencio acompanha meu trajeto até o momento em que nos desviamos à esquerda, pra iniciar a ascensão sobre a morena, uma íngreme ladeira formada por rochas de tamanho médio a grande, que conduz ao mirador de onde se avistarão as torres. Este trajeto, sim - embora dure apenas 50 minutos - é bem puxado! Afinal percorre-se um desnível de 350 metros até se atingir o topo da elevação onde, enfim, podem ser admiradas as três agulhas de granito: a Sul, a Central e a Norte que, para os desavisados, parecem duas pois apresenta duplas pontas. Aos pés das Torres bóia um l
ago de serenas águas verdes. Não entendi, até porque nem questionei, as torres significarem, apesar de sua cor rosa, azul na linguagem indígena. Ao lado da Torre Norte, vêem-se os cerros Peineta e o Nido de Condor, uma formação rochosa magnífica, pontiaguda, formato retangular, colorida de preto no topo e cinza claro na base. No lado oposto, a face nordeste do Cerro Almirante Nieto. Sento-me e fico apreciando aquele lindo anfiteatro de rochas. O dia, soberbo, céu, azul, desembaraçado de nuvens. Um passarinho pousa perto de mim, foco a câmera e disparo, aprisionando a ave na memória digital da máquina. Apesar do bom tempo, começa a cair águanieve, como chamam aqui a neve em flocos diminutos. Tudo é tão bom, a vida é bela e eu me sinto viva demais. Descemos do mirador e atravessamos o acampamento Torres na intenção de alcançarmos o vale do Silêncio, situado no final do vale Ascencio, à esquerda. Ambos os vales, apesar da pequena altitude, são considerados de alta montanha devido a simila
ridade das condições climáticas. Avisto no fundo do vale Ascencio os cerros Cabeça de Índio e o Oggioni. Embora pequenos, estes dois vales são morenas e portanto nada fáceis de caminhar, em sendo assim, desisto: além de passar das 4 da tarde já me sinto bem cansada. Daniel e eu retornamos, chegando ao refúgio Las Torres às 19 horas, já sem luz do sol. Sinto-me bem contente, afinal havia percorrido 22 km, e a janta é tudo de bom: sopa de verduras, merluza coberta com cebola e uma fatia de tomate com orégano sobre um colchão de acelga e, de sobremesa, um flan de leite. Se a comida nos outros refúgios for tão boa, quanto a servida neste, vou acabar engordando!




Nenhum comentário:
Postar um comentário