quarta-feira, 18 de abril de 2007

Passeio no cemitério

Ontem, enquanto retornava do restaurante Sotitos, o céu mostrou-se estrelado, eu fiquei bem feliz, até comentei, com meus botões: "finalmente, a chuva vai me dar uma trégua e vou poder dar uma boa caminhada pela cidade amanhã."Bah...não deu outra! De manhã até não choveu mas como fiquei no hotel até tarde fazendo uma coisa e outra, não usufruí do bom tempo matinal. Agora, 18 horas, a chuva ainda lambe sem piedade as ruas da cidade, enquanto bebo um drink no Pub 1900, bem na esquina da Bories com a Cristobal Colon, meu point durante a breve permanência em Arenas. Estou encarangada após ter feito o city tour abaixo de chuva, vento e frio, por isso nada melhor que um conhaque pra aquecer meu corpitcho. O passeio dura 2 horas e meia e vale, principalmente, pela visita ao cemitério. Uma lástima a chuva não ter dado trégua de modo a permitir que se percorresse, sem pressa, suas aléias enfeitadas com ciprestes europeus podados em formato cilíndrico. O terreno do cemitério foi doado por Sara Braun, imigrante russa que veio para a cidade no final do século XIX. Reservou esta dama, para si, um bom espaço, cercado de gradis de ferro, onde estão plantados centenários pinheiros, ciprestes, louros e plátanos. Num canto deste pequeno parque fez construir um mausoléu, em estilo árabe, de granito e mármore brancos, portas de bronze, esculturas de anjos, tudo muito suntuoso. Há outros, também, ricamente adornados, porém nenhum ocupa área tão grande quanto o de Sara Braun. Há jazigos pertencentes à várias associações como as dos bombeiros, as dos imigrantes croatas, as da armada chilena etc.
Há tumbas simples cobertas por flores variadas dando um colorido simpático a tão sóbrio lugar. Saindo de lá, fomos ao museu Salesiano Maggiorino Borgatello onde estão expostas mostras de etnologia, flora e fauna patagônica; também conta com mostra dos missionários, artesania indígena, fósseis e animais petrificados, ferramentas e canoas usadas pelos aborígenes. Quatro eram as etnias, sendo os tehuelches os mais altos (altura média 1,80m). Duas eram sedentárias, vivendo da caça, as demais eram nômades, exímios canoeiros e pescadores, mantendo sempre aceso e protegido um fogo dentro de suas embarcações. Todas as etnias eram monogâmicas e prezavam muitos os laços familiares. Os homens só caçavam ou pescavam, já as mulheres faziam todo o resto: comida, roupas e utensílios, sendo que algumas eram excelentes mergulhadoras, destacando-se na coleta de moluscos. Terminamos o passeio na Plaza de Armas em cujo centro foi construído o monumento em homenagem ao famoso navegador português Fernão de Magalhães, descobridor da passagem entre o Atlântico e o Pacífico, numa rede de intrincados canais como hoje é conhecido o estreito de Magalhães.

Reza a lenda que quem tocar no pé do índio que se encontra reclinado na base de pedra do monumento não deixará de regressar à cidade. Eu peguei no pé dele, uhuuu! Numa das esquinas em frente à praça, encontra-se o palácio de Sara Braun, uma mansão de dois pisos, cuja fachada exibe um jardim de inverno enquadrado numa estrutura metálica finamente trabalhada. Abriga atualmente o Club Union e um sofisticado e caro hotel. Incrível mas desde sexta-feira, quando eu ainda me encontrava em Puerto Natales, chove nesta região. Hoje com mais intensidade do que nos dias anteriores. A cidade é atravessada pelo rio das Minas, assim chamado porque o carvão já foi muito explorado por estas bandas, tendo sido construída, inclusive, na avenida Cristobal Colon, uma ferrovia usada no transporte deste minério cuja extração obtinha-se de um cerro situado no entorno da cidade. Infelizmente, não foi preservada, e de seus trilhos e da linda estação revestida com ladrilhos já nada mais resta. O rio das Minas atualmente é um pobre filete de água, poluidíssimo, onde se vêem boiando inúmeros detritos, dentre os quais pneus jogados em seu leito. Janto no restaurante El Remezon, outra dica do Nelson. No ambiente, simples, há três salas, uma delas ocupada unicamente por uma grande mesa redonda e cadeiras.

O menu, um quadro-negro onde está escrito a giz o cardápio de 12 pratos, encontra-se colocado num atril, à entrada. A pequena garçonete, vestida em trajes masculinos, coloca-o a minha frente para que eu faça minha escolha. O frio exige algo quente, motivo por que peço uma sopa de alho - gente, que coisa boa esta sopa, absolutamente di-vi-na! (feita com pão torrado ralado, caldo de carne e alho, é claro), uma salada de abacate, tomate e alface e o tal menu degustação: guanaco ao vinagrete, patê de ñandu, carpacio de castor e cordeiro aux poivre (adoro o carpacio de castor, muiiiito bom, pena vir tão pouquinho). A sobremesa, uma coisa hor-rí-vel, chamada mil folhas, a massa da grossura de um dedo de gordo, fico impressionada com a total ausência de delicadeza. E pra culminar sabem com o quê é recheada?! Doce de leite...arghhh! Como aquela mil folhas está me provocando borbulhas no estômago, entro num simpático barzinho e mando ver num Porto tinto, excelente digestivo que se deve usar em situações estomacais embaraçosas. Dia seguinte, acordo nova em folha, graças ao famoso vinho português, pois, pois!

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