quarta-feira, 10 de dezembro de 2003

Laguna del Desierto

No terceiro dia de minha estada em Chaltén, vou de carro à Lagoa ou Laguna del Desierto, porque não estou lá com muita coragem em ir caminhando sozinha (por ser minha primeira viagem, não era tão destemida quanto sou agora, se bem que em lugares desconhecidos prefira, por segurança, contratar guia). Durante o percurso são freqüentes ahs! e ohs!, já que corre, paralelo à estrada de chão batido, à direita, o Rio de Las Vueltas, exibindo águas claras e espumantes que deslizam velozmente por seu pedregoso leito em desnível, cujas margens hospedam bosques de lengas e ñires; à esquerda, Chorrillo del Salto, uma cascata de 15 metros de altura, cujas abundantes águas se depositam em um lago cristalino. Mais adiante, ainda à esquerda, o belíssimo Cerro Elétrico, cobertíssimo de neve, no meu entender o mais lindo dos cerros da região. Em duas horas alcançamos a ponta sul da laguna, de onde pego um barco que me leva à ponta norte, distando uma da outra 15 km. Durante a travessia, de aproximadamente 30 minutos, feita quase toda na parte externa da embarcação (não estava nem aí para o friozinho), curto a espuma branca que sua proa desenha no verde da laguna, enquanto respingos de água atingem meu rosto. De um lado, na margem leste, os verdejantes bosques, ao passo que, na margem oeste, chama-me a atenção várias cascatas, cujas águas alimentam continuamente a laguna del Desierto. Atrás das colossais paredes de granito que a sombreiam, se escondem os 350 km de extensão do impressionante Campo de Gelo Patagônico Sul, a massa de gelo continental mais importante depois da Antártida, do qual se originam os glaciares que alimentam os lagos da região, sendo os mais famosos Perito Moreno, Upsala e Viedma. Acomodada numa pedra à beira do lago, admirando a deslumbrante paisagem circundada por bosques e cerros atapetados de neve, avisto, para minha surpresa, nada mais nada menos que o já manjadíssimo (blasé eu, hein?!) Fitz Roy, sem saber que é sua parede noroeste (por sorte, apesar de o dia continuar nublado e meio frio, não há nuvens encobrindo esta face), vista, portanto, de um ângulo diferente daquele apreciado no dia anterior, já que a exibida diante das lagunas Sucia e de los Tres foi a sudeste. Dou um pequeno passeio pela margem da laguna, encantada mais uma vez pelo silêncio que, seria absoluto, se não fosse quebrado pelo chap chap regular das águas lambendo suas areias. Na volta, vou bisbilhotar o albergue, uma construção de madeira, composta duma cozinha com todos os utensílios necessários para se fazer um ranguinho, quartos (2 ou 3, não lembro bem) e sanitário, proporcionando, assim, um confortável pernoite àqueles que empreendem a longa caminhada de 37 km desde Chaltén. Enquanto retornávamos ao vilarejo, soube pelo guia que, no outono, embora a temperatura não seja tão amena quanto nesta época do ano, os ventos amainam e os bosques de lengas e ñires assumem uma coloração vermelho-alaranjado espetacular, sugestão guardada de pronto em minha cabecinha. Quem sabe um dia retorno a tempo de ver tal espetáculo, não é mesmo?

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