segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Durbar Square

Acordo com uma batida na porta. É um empregado avisando que o desjejum é servido somente até às 10. Nunca tinha visto isso! O staff do hotel preocupado quando percebe que o hóspede não foi ainda tomar café!! Coisas do Nepal! E lá vou eu pro salão de refeições que serve de cozinha também. As toalhas, não muito limpas, causam-me um pouco de nojo. O tal breakfast nepali - que de café da manhã, pra mim não tem nada, deveria ser, isso sim, chamado de lunch - oferece além de omelete e salsichas, couve-flor, tomate e vagens refogadas...arghh!! Ainda bem que há frutas e suco, este artificial e doce demais, mas enfim. Mordisco uma torrada sem grande vontade. Em compensação, o dia está ensolarado, magnificamente azulado. Da janela do meu quarto, vejo casas, muitas delas com terraços floridos. É um país deveras colorido este! Ainda com fome vou até o Pumpernickel completar meu desjejum e mando ver num sandu de pão preto com queijo de yak. De bebida, chá de masala com leite, uma mistura de especiarias e chá preto, cujo sabor, levemente apimentado, é uma de-lí-cia. Bem alimentada, vou visitar a Durbar Square de Kathmandu. Embora tenha comprado um mapa da cidade, nem o retiro da mochila. No meu caso, é pura perda de tempo. Atrapalho-me toda quando tento usá-lo. Assim, vou perguntando, no velho esquema "quem tem boca vai a Roma". Além do mais, adoro parar e bater papo com as pessoas. As ruas, invariavelmente, encontram-se apinhadas de gente e veículos. Um grande bazar, um big soukh a Thamel: lojas, lojas e mais lojas a perder de vista. Então surge a pergunta que não quer calar: onde moram as pessoas? Nos fundos das lojas? Em cima das lojas? Nos porões das lojas? E lá sigo eu, indagando dos transeuntes a localização do centro histórico. Como quem não quer nada, um jovem cola em mim e começa a conversar. Explica que, antes de eu ir a Durbar Square, devo conhecer um templo localizado numa praça próxima dali. Eu, enfrentando a maior dificuldade em entender seu inglês, consigo pescar lá pelas tantas que ele é estudante de História e resolveu ser meu guia. Eu, cá com meus botões, resmungo que não tô lá muito afim, mas resigno-me e deixo que ele me guie pelas tortuosas vielas. E lá vamos nós até a tal praça onde há um templo bem bonito (aliás, não faltam templos nesta cidade). Habilmente, o guia me conduz até uma loja onde são vendidos quadros pintados em telas de algodão. O artista mostra suas pinturas, muito lindas mas que não fazem meu estilo. A caro custo, consigo escapulir da loja, seguida entretanto pelo guri que não larga do meu pé. Digo pra ele que quero ficar só, não adianta. Se faz de desentendido. Entro numa loja e lá finjo que compro algo, me demorando de propósito. Só assim, consigo me livrar dele...ufa, que trabalheira!! Ora, tá na cara que ele deve estar a serviço do tal pintor. Se fazendo de guia, leva o turista desavisado até a tal praça com a desculpa de mostrar a stupa, conduzindo, então, o pobre otário até o interior do ateliê do artista, um sujeito magrinho e untuoso, insistente como todos seus conterrâneos comerciantes. No primeiro dia, eu achei pitoresca tal atitude, agora, entretanto, já tô começando a perder um pouco a paciência com eles. Há momentos em que as ruas ficam relativamente calmas, mas são brevíssimos esses lapsos, porque logo, logo as estreitas ruelas ficam atravancadas de motos, carros, bicis e riquixás, todos buzinando incessantemente. À medida que vou me internando na Thamel, observo que as casas, com fachadas de madeira coloridas, apresentam na parte térrea um pé direito bem baixo onde centenas de lojas estão instaladas. Me dou conta de que já estou no coração da cidade velha. Diversas lojas de tecidos, alguns ricamente bordados com fios dourados e prateados, onde a clientela senta-se em bancos baixinhos, enquanto os vendedores desembrulham as peças coloridas e as espalham no chão. Alguns clientes levam o tecido pra rua de modo a melhor examinar o material. Joalherias expõem jóias em ouro, num rico trabalho de ourivesaria que lembra uma renda tal a delicadeza do desenho. Nas ruas, vendedores ambulantes empurram seus carrinhos apinhados de bananas, laranjas, mamões e abacaxis. Estacionada no meio fio, uma carrocinha oferece variados tipos de grãos, destacando-se, entre os que conheço, milho, amendoim, pistache e flocos de arroz. Fico observando a vendedora, em cuja testa foi pintado o tilak vermelho, preparar um snak pra duas mocinhas com cara de chinesas (o povo nepalês quando não tem cara de indiano tem cara de chinês). Ela coloca num cartucho de papel uma porção de flocos de arroz além de outros grãos escolhidos pelo freguês. O cone é sua medida. Passa então a mistura pruma tigela de plástico onde pinga uns temperos líquidos, mexendo tudo com uma colher. Verte tudo novamente pro cone, enfiando um quadradinho de papel no cartucho cuja utilidade é servir de colher. Fico louca pra provar mas antes de fazer trek me resguardo de comida de rua. Finalmente, chego à Durbar Square onde pago 300 rps e ganho um folheto explicativo sobre o lugar. Fico sabendo, então, que se trata dum importante centro cultural, denominado Hanuman Dhoka Durbar. O lugar abriga um complexo de templos e palácios budistas e hinduístas. Alguns dos edifícios datam do século 12. A arquitetura de muitos deles segue o estilo pagode de onde pendem panos vermelhos. Muitos deles exibem fachadas de madeira ricamente esculpidas. Dois homens tiram fotos na frente de Hanuman, um dos avatares do deus Shiva, muito venerado por estas bandas. Sento pra observar o movimento. Dezenas e dezenas de carregadores levando nos costados tudo o que se possa imaginar: desde fardos de mercadorias a cadeiras e mesas.  Enfim, o diabo a quatro, e sem distinção de idade! De jovens a velhos, incluída, aí, uma mulher, carregando um colchão! Num largo, feirantes oferecem uma variedade de frutas, legumes, verduras, peixes defumados e pães. Mulheres, incrivelmente habilidosas enfiam linha dentro dos caules de flores, resultando colares amarelos e roxos lindíssimos. Outras, com igual destreza e rapidez, tecem, com folhas de bananeira, pratos fundos super bem feitos. É muita informação visual. Não à-toa, os hippies, na década de 70, descobriram Kathmandu e vieram pra cá curtir toda essa psicodelia. Abundam as stupas, desde as mais imponentes até as mais humildes. É um entra e sai constante nos templos onde as pessoas acendem velas, levam suas oferendas e rezam com muito fervor pros seus deuses. Curioso observar até que ponto um nepalês é budista ou hinduísta, as duas religiões predominantes no país. Acontece de, numa família, o pai professar o budismo embora a mãe seja praticante do hinduísmo. As duas religiões coexistem pacificamente, sem estresse algum. À noite, resolvo me presentear com um jantar num aconchegante restaurante iluminado por luzinhas coloridas. Escolho uma mesa abrigada sob um alpendre de madeira já que a temperatura amena é um convite a se ficar ao ar livre. Peço uma comida nepalesa, servida em pequenos potes de metal, exceto o arroz, colocado num prato raso. E, assim, como brócolis, carneiro, cenouras e couve-flor ensopados, além de molho de iogurte e de pimenta. A comida, apimentada, é gostosa. Minha janta custa 500 rps que se eleva pra 625 rps devido ao alto custo do imposto sobre serviços. Nem me arrisco a parar diante de alguma vitrine, antes de retornar ao hotel, senão já já começa o assédio dos comerciantes. Se fosse sexual, eu até levaria na boa mas, infelizmente, não é, hehe.

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