sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Voando de helicóptero

Chegou o dia de minha partida pra Kathmandu. Tsk tsk tsk....estou com um pressentimento de que não será hoje. E não é pessimismo. Apenas lógica matemática! Há 12 aeronaves na frente da nossa e o tempo, que amanheceu razoavelmente bom, nesta quinta-feira, dia 18, começa agora, meio-dia, a fechar novamente. Nuvens compactas invadem o vale...ai ai ai. Tô sentindo que não será hoje que sairei de Lukla! Um clima de preocupação, irritação, impaciência e resignação toma conta das pessoas. No Tara Lodge, a movimentação dos hóspedes, na hora do almoço, é intensa. Aqueles que estavam no aeroporto, aguardando seus vôos, frustrados, retornam para almoçar. Para uns, a situação é dramática porque a data de retorno aos países de origem está vencendo. O tempo, nem aí pros aflitos turistas, piora, mantendo-se cerrado durante o resto do dia. Até os vôos de helicóptero são cancelados porque o nevoeiro é espesso pra caramba. À tardinha, uma chuvinha miúda começa a cair. Eu que prefiro bater perna do que ficar em meu quarto, considerando a "luxuosa" acomodação em que estou instalada, retomo minhas andanças por Lukla. Após a janta, Dhoma, a garçonete que atende no refeitório, põe música nepalesa tradicional, com uma leve batida moderna. É o sinal prum grupo de japoneses, seus guias e porters se porem a dançar. Animados, os japoneses, já meio no tragoléu, dançam desinibidamente. Parecem garotinhos fazendo fuzarca. Até eu entro na roda e ensaio, meio sem graça, uns volteios pelo salão. E não é que os japas comem tangerina, maçã e batata frita, tudo isso regado a uísque?! Servirá talvez como paliativo contra a ressaca do dia seguinte? Coisas de japoneses. Vá lá saber, hehe. Graças a deus, hoje, sexta-feira, o tempo dá uma melhorada, o que permite avistar as montanhas situadas ao sul da cidade. Oxalá os vôos de avião sejam autorizados e eu consiga, finalmente, retornar a Kathmandu. Já estou ficando meio de saco cheio de estar aqui em Lukla, já que sou obrigada a ficar de prontidão, no hotel, porque, a qualquer momento, Nara pode me chamar pra eu ir pro aeroporto embarcar em meu avião. E as conversas, coisa chata, acabam sempre descambando no mesmo assunto: aluguel duma vaga num helicóptero. Alugar ou não alugar, eis a grande dúvida da turistada. Após avisar Nara, saio do hotel (não agüento mais ficar parada) e vou dar uma banda. E quem encontro, fumando um cigarro, bem tranquilo, na rua principal? O glaciologista francês!! Sentados na beira da calçada, conversamos em espanhol. Embora o dia esteja frio, o sol brilha generoso no céu. O movimento de turistas na rua diminuiu consideravelmente. A maioria ou se mandou pro aeroporto ou permanece em seus hotéis, aguardando serem chamados para embarcar. O Starbuck onde, ontem, havia gente saindo pelo ladrão, exibe, hoje, meia dúzia de gatos pingados. Sobram lugares onde sentar. Desde terça-feira tenho conhecido pessoas bem diferentes entre si: um casal, ele de Bahrein, ela tcheca, dois italianos que se conheceram durante o trekking; o mais velho, tranqüilão, ao passo que o mais jovem, só sabe reclamar e soltar muxoxos irritados por causa da estadia forçada; um casal de holandeses em lua de mel; uma escocesa bem jovem cujo trabalho voluntário envolve resgate, na fronteira entre Índia e Nepal, de crianças nepalesas seqüestradas pra diversos fins, nenhum deles lícitos, por óbvio; um casal de alemães super simpáticos que trabalha com mergulho numa ilha na Malásia; um inglês que curte sua lua de mel viajando ao redor do mundo (a mulher ficou em Kathmandu porque não gosta de trekking) e mais dois bombeiros italianos, muito contentes com tudo, que fizeram Island Peak e Mera Peak. Na rua, quando passo, reconheço rostos e sou reconhecida. Há trocas de sorrisos e saudações. O sol que até então dera pinta na cidade se retraiu. Novamente, o tempo se encaramuja...ai ai ai. Até então não estava esquentando muito com minha permanência forçada aqui. Agora, porém, já começo a ficar meio atucanada. De aviões, só dois decolaram. Nenhum, entretanto, chegou de Kathmandu porque, pra complicar mais a situação, o tempo lá está ruim, com muita névoa também. E, de repente, eu na rua principal sou abordada por um turista que pergunta se não topo dividir um vôo de helicóptero com ele amanhã. Quando olho pro lado, vejo Nara fazendo sinais pra que eu não aceite. Respondo que vou pensar no assunto e marcamos de nos encontrar no fim da tarde. Nara, quando eu me livro do homem, explica que está vindo de Kathmandu um helicóptero e que eu posso ir nesse vôo se quiser. O vôo custa 900 dólares!! Resolvo encarar tal despesa, ai ai ai. Fazer o quê, se quero passar mais dois dias em Kathmandu antes de deixar o país na segunda? Vamos até a loja e acertamos o negócio, num clima de nervosismo e ansiedade. Eu passo o cartão, eles me entregam uma quantia em dinheiro. É tudo muito rápido, tenso, porque o helicóptero já está no heliponto do aeroporto. Peço a Nara que pegue minhas bagagens no hotel. O bom guia sai correndo. Eu não entendendo porque me entregaram tal quantia pergunto o motivo. Os intermediários tentam explicar em um péssimo inglês, até que um homem pega a grana e me faz sinal para que eu o siga. Correndo através duns becos, chegamos no portão do aeroporto. Um guarda não permite que entremos embora o homem tente argumentar. De nada adianta, contudo. O guarda mantém-se irredutível. Eu suo frio apesar de não fazer calor, muito pelo contrário! O intermediário, então, vê um homem do outro lado da cerca e o chama. Após breve conversa, enfim, a permissão pra entrar. E descubro que Nara conseguiu fazer com que eu furasse a fila na frente dum monte de turistas que esperavam há mais dias que eu. Nem consigo me envergonhar, tão excitada estou. É minha primeira viagem no besourão mecânico, hehe!! O helicóptero, já com as hélices em movimento, faz aquela ventania, levantando uma poeirama ao redor. Mais três passageiros, todos homens, embarcam junto comigo na aeronave. E da minha bagagem nem pista. Aflita, só me preocupo com os cartões contendo todo o conteúdo visual clicado e filmado até então. Cadê Nara, meu deus? Espio pra fora na esperança de que Nara surja com minha sacolona verde mas nada. E o bichão levanta vôo. É emocionante demais!! Avião nenhum proporciona tão ampla visão como a que se usufrui num helicóptero. E lá vou eu olhando à esquerda e à direita, encantada com tudo o que vejo. Nesse voo, visualizo, perfeitamente, a perigosa topografia no entorno de Lukla, motivo por que é tão difícil e arriscado pousos e decolagens quando há névoa, mesmo que não seja espessa. Assim que decolamos, ingressamos num estreito vale, formado por um maciço de montanhas cuja altura não é inferior a 5 mil metros, num percurso que se estende por mais ou menos 4 km. A viagem até Kathmandu, super tranquila, dura pouco mais que 1 hora. São e salva, encontro a capital, ensolarada, e Sunir, sorridente, a minha espera, me acalma quanto à bagagem. Amanhã, Nara, vai despachá-la....eeebaa!!

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