06/04/2017 – Quinta-feira – 20º
Dia de Trek Everest BC – Thangnak a Gokio
Localizado
a 4.900 metros, o vale, ao redor de Thangnak, exibe aqui e acolá raríssimos tufos
de gramínea germinando no solo pedregoso. À sombra dum enorme paredão rochoso, a
vila é contemplada com o imponente maciço do Machermo. Dia lindo e frio quando
saímos às 8 e 45 de Thangnak. Como a caminhada será curta, desnecessário partir
mais cedo, como
usualmente acontece. Os 30 minutos iniciais de pernada, numa zona plana, são barbada. Avisto ao norte, expressiva elevação compactamente coberta de
neve: é Cho Oyo. Que lindo este 8 mil! Pra alcançar Gokio, vila onde
ficaremos durante 2 dias, é preciso descer pela moraina esquerda do glaciar
Ngozumpo, atravessá-lo e então subir sua moraina direita. Antes de baixarmos ao fundo da maior geleira do Nepal, paramos, no alto da moraina, pra
admirar a paisagem: no lado oposto, na moraina direita, Machermo, o passo Renjo
La e Gokio Ri em cuja encosta sul é perfeitamente distinguível a trilha que
conduz ao topo. Ao sul, Cholatse, Taboche e Thamserku tornam-se visíveis
novamente, enquanto ao norte, a constante alvura do magnífico Cho
Oyo é um colírio pros olhos. As dificuldades começam ao descer a inclinada
moraina cuja encascalhada trilha, embora curtinha, requer mais cuidado que o descenso do Cho La. Em certo ponto, sento e desço de bunda, vá que eu caia, né? Não
tô a fim de me arriscar e torcer um pé ou coisa pior acontecer....valha-me
deus! O cenário no interior do glaciar é cinza-claro devido aos detritos rochosos que cobrem seus blocos de gelo. O fantástico labirinto formado por estas colinas de pedras, cascalhos e seixos origina um sobe e desce contínuo durante a travessia. Exceto um que
outro lago, a maioria, congelada, oculta a pálida coloração azul-esverdeada de
suas águas. O movimento de turistas não é intenso, na verdade, muito de quando
em quando cruzo com algum grupo indo ou vindo de Gokio. Os uniformemente nevados flancos do Cho Oyo dão aquele toque
branco no panorama cinzento. Já bem próxima à moraina direita, escuto ruído de
pedras que rolam pela encosta, levantando poeirenta nuvem em seu rastro.
Começo meio que a surtar porque estamos perto da parede. Segundo Nir, o
otimista, a travessia do Cho La é muito mais perigosa porque o tamanho das
pedras são maiores enquanto aqui não passam
de seixos, pode? Não sei se essa
resiliência nepalina é invejável ou irritante. Tenho de refletir melhor sobre
isso, mas noutro momento pois agora quero mais é escapar rapidinho desta armadilha
medieval de pedras que caem a poucos metros donde estou passando. Por fim, breve caminhada, equilibrando-me numa estreitíssima trilha e a última subida,
super verticalizada, até o topo da moraina direita. Daqui pra frente, a
paisagem vai perdendo aspereza à medida que se desce um terreno coberto com boa
quantidade de gramíneas até Gokio, situada a 4.750 metros de altitude, onde
chegamos ao ½ dia. Da vila, descortinam-se, além da superfície congelada do
Gokio Cho (Cho significa lago em nepali), o portentoso pico Machermo, à esquerda, e Gokio Ri, à
direita (Ri significa pico em nepali), cuja encosta desta distância aparenta suavidade. No
Nepal, contudo, nada é o que parece ser. Assim, só amanhã quando subi-lo comprovarei ou não
tal impressão.
07/04/2017 – Sexta-feira – 21º Dia de Trek Everest BC – Gokio



07/04/2017 – Sexta-feira – 21º Dia de Trek Everest BC – Gokio
Saímos às 8 rumo ao topo do
Gokio Ri, subindo sua nada gentil encosta iluminada pelos raios solares. Como
indicação da rota, centenas de pedras retangulares foram posicionadas
verticalmente, parecendo arbustos sem folhas. Surreal atravessar esse pequeno
bosque pétreo. Paro uma meia dúzia de vezes pra normalizar os batimentos
cardíacos e beber água.
Perto do topo, rajadas de vento baixam a sensação
térmica e passo a sentir muiiito frio. Na errônea suposição de que vestir jaqueta
de penas de ganso seria exagero, dispensei-a. Assim, visto uma ceroula por
baixo da calça, 2 camisetas dry fit, blusão fleece e mais um casaco do mesmo
material. O que me salva a pele foi improvisar com a segunda ceroula de fleece
- retirada no início da jornada porque me sentia acalorada - um abrigo pra
proteger e aquecer melhor a parte superior do tronco. Tão gratificante atingir
o cume! Rio, alegremente, orgulhosa da façanha. Afinal, já é o terceiro pico
com altitude superior a 5 mil metros alcançado em uma semana! Alegres e
coloridas bandeirolas recheadas de mantras budistas enfeitam a finalera do
Gokio Ri e seus 5.357 metros. Num nicho entre rochas, dentro duma gaiola
amarela, uma estátua dourada de Buda mira seu olhar na vila. Daqui de cima, quatro
oito mil - 4!! - são super mega bem avistados!
Além dos notáveis Cho Oyo, Lhotse e Makalu, surpreeesaaa! Eis finalmente visível generosa porção do flanco sul do Everest e não mais aquela minúscula ponta, mesquinhamente entrevista tanto do Khala Patar quanto do Everest BC. Mirante admirável este do Gokio Ri! Se não bastasse vislumbrar tais gigantes, distingo ainda picos de 6 e 7 mil como Najumba, Lobuche, Nuptse, Cholatse, Taboche e Thamserku. Seria ouro sobre
prata minha permanência no cume se não fosse o vento. Descida tranquila porque são poucos os trechos
com areia e seixos. Ao contrário da subida, na cansativa concentração
em dar um passo após outro, focando em chegar lá em cima, quando às vezes dá
ganas de mandar tudo às favas e desistir, a descida é cheia de atrativos. Encantadora
visão a superfície quase encoberta por fina camada de gelo do lago Gokio Cho,
deixando a descoberto ínfima porção da bela coloração turquesa de suas águas. Também
chamado Dudh Pokhari, é o principal manancial num
sistema de 19 lagos,
espalhados em 196 hectares, fonte permanente de água fresca. Avisto, ainda
durante a descida, construída à margem oriental do lago, a pequena vila
e o belo maciço de 6.237 metros do Machermo. Chegamos ao lodge às 13 e 30 e no
variadíssimo cardápio constam não só culinária nepalesa como italiana,
tailandesa, coreana e indiana. Escolho pro almoço minha dieta de veg fried rice.
Descanso o restante da tarde no refeitório, aquecido que está pelos raios
solares, razão por que os hóspedes preferem aqui aos seus gélidos quartos. Há
gente de várias partes do planeta: japoneses, romenos, neozelandeses,
irlandeses, norte americanos, australianos e ingleses. Dois jovens deitados nos
bancos almofadados dormem placidamente. Em todos os lodges, os refeitórios são
aquecidos durante o dia pelo sol e à noite pelas salamandras, sabiamente,
posicionadas no centro da
peça. Se eu pudesse, dormiria nos refeitórios. Não há
guest house no Solukhumbu que não tenha à venda cervejas, em especial, a San
Miguel, de fabricação nacional apesar do espanholado nome no rótulo. Incrível a
quantidade de trilhas que riscam a encosta do Gokio Ri rumo ao cume. Durante a
janta, senta à mesa, onde estou com Nurbu e Nir, simpático e jovem japonês. Acabou
de escalar o Island Peak. Pretende, ainda, fazer cume no Mera Peak e pra lá se
dirige amanhã. Após temperar sua massa com a forte pimenta nepali, o rapaz protagoniza cena hilariante. Na primeira garfada, começa a suar em bicas não parando de comer nem mesmo pra secar o suor que verte abundante do seu rosto. Esfomeadíssimo, pede outro prato,
dessa feita sem pôr pimenta, hahahaha. Coitado de Nurbu, queixa-se de dor de
cabeça provocada pelo aperto da fita em sua testa presa às nossas 2 mochilas pra melhor equilibrá-las. Vem carregando esse fardo há 20 dias. Não à-toa, considero os porters os verdadeiros super
heróis da vida real! Noite escura, 19 horas, minha atenção é desviada pra pequena
procissão luminosa que desce a encosta do Gokio Ri. São lanternas de testa
usadas por turistas que foram mais tarde fazer cume de modo a poder assistir ao
pôr do sol. Putz, invejável decisão!




Um comentário:
" O que se leva dessa vida é a vida que a gente leva!" Bea, minha querida amiga, que vida linda a sua! Com sabedoria vais usufruindo os seus dias neste nosso planetinha a modo de só te orgulhares e te sentires feliz e realizada da vida que estás vivendo! Grande abraço carinhoso, querida!
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