Nem tão encoberto assim o céu que não possa revelar
rasgos de azul às 7 da manhã quando saio da barraca pro desaiuno. São servidas
panquecas e os recheios são os mesmo do dia anterior: geleias de pêssego e morango mais calda de
chocolate. Café ou chá pra acompanhar. Ah, sempre tem queijo ralado para se
pôr na arepa ou na panqueca. Nesta
manhã estou super excitada porque hoje é dia
de topo!! Enfim estamos nos dirigindo até o topo do
tepui Auyan motivo por que saímos bem cedinho: 7:30. A trilha atravessa uma
zona de mata cujo pedrario exige o uso constante das mãos, num trepa e desce
pedras constante. Tal subida nem se compara com a do Roraima. Em retrospecto, aquela
foi moleza mesmo!! Num dos breves descansos para recuperarmos o fôlego, Fred
nos dá pra chupar um talo verde que vem a ser um tipo de palmito. Aborrecido um
trecho coberto com troncos de arbustos caídos na trilha à semelhança dum
manguezal seco. Como estamos escalando a base da parede sul do tepui, é pedra
sobre pedra cercado de mata por todos os lados. Por isso, até a base do paredão
é só subida dura: pura escalaminhada, quando então o terreno se aplaina numa
estradinha de areia branca ladeada pela muralha que faz parte da face sul do
tepui. Fazemos uma pausa e Fred aproveita pra praticar um pouco de boulder na
pedra, imitado pelo espanhol e belgas. Fico só admirando a
precisão e
elasticidade dos movimentos feitos pelo guia a cada lance. Tanta flexibilidade
lembra certos passos de balé, motivo por que o apelido de Nureyev de las rocas! Durante o descanso, a
neblina dá uma pausa e permite que se avistem, finalmente, o que mal
entrevíamos quando aqui chegamos: os gigantescos totens de pedra que guardam a
trilha. Um baita indício das maravilhas que teremos pela frente! A partir do
paredão as escalaminhadas exigem corda. O tempo nublado não permite que se
desfrute completamente da beleza das torres mal entrevistas através da
névoa. A partir daqui foram mais de 7 ascensos usando cordas até o topo do
tepui. Brutal o esforço físico dispendido, como observa certeiramente o espanhol, não todavia
para os porteadores que passam agilmente por nós como se fossem salamandras de 2
pernas. Sensação inebriante caminhar entre blocos gigantescos de
rocha onde nasce densa vegetação cujos destaques ficam por conta de exuberantes bromélias, palmeiras,
samambaias e arbustos de médio porte. Essa parte lembra um canyon, confinada
que está entre os impressionantes rochedos. Quando a névoa se dissipa um pouco, se
avistam espaços vazios entre as torres de arenito. Num desses, apelidado de
Callejón de las Palomas, Fred pede um pouco de silêncio aos tagarelas belgas e
franceses de modo que se possa escutar o arrulhar dessas aves que
fazem do buracão seu ninho. A fatigante subida entre as colossais agulhas acaba
de repente com Fred avisando que já estamos no topo. Ele nos recebe com um sorriso e um abraço de boas
vindas. Minha alegria me faz rir igual criança. Refeita da emoção, percebo
então as 2 muralhas dispostas perpendicularmente uma a outra. Ignoram os guias qualquer informação sobre a
1ª porque lá nunca estiveram. A que importa é a 2ª, velha conhecida deles
porque necessário subi-la e cruzá-la até alcançar o paredão por onde despenca
Salto Angel. Justamente por essa parede
iniciaremos nossa descida de retorno. É
um mundo totalmente inédito o topo do Auyantepui que, na língua pemon, significa montanha do diabo. Ao contrário do Roraima,
surpreendente a densa cobertura vegetal com matas de galeria ao longo dos rios que riscam de amarelo o solo do Auyantepui. A coloração mais clara dos maciços rochosos (um me lembrou as Prateleiras, do Parque Nacional de Itatiaia) colabora também pra tornar o ambiente menos opressivo . O céu
mantém-se nublado embora a neblina tenha se dispersado. Em certos trechos mais
expostos de rocha, precisamos lançar mão, de novo, do uso de cordas mas nada que se compare
à excitante aventura que encaramos até o topo. Andamos uns 10 km até às 13 horas quando paramos
para almoçar à beira do rio Naranja cuja coloração caramelo da água é estupenda! Uma pena que esteja quase seco devido a
pouca precipitação pluviométrica
durante o verão mas nada que impeça os belgas de se banhar. Restam, ainda, algumas poças que permitem que se abasteçam
d’água as garrafas. Sedenta do jeito que estou bebo até doer a barriga. O
almoço supera as expectativas. Fred serve lau lau (peixe de água doce)
defumado, abobrinha, berinjela e abacaxi desidratados, cebola e pimentão crus. Fred conta que ao invés de cursar faculdade, preferiu estudar
culinária, fotografia e técnicas hospitalares. Chegamos no acampamento El Oso (2.165
msnm) às 15:30 quando as nuvens começam a se dissolver revelando, enfim, a face azulada do céu. El Oso, também, é um acampamento que aproveita o baita teto formado por uma reentrância na rocha. Na janta, é servido
arroz com linguiça. Pena que o arroz esteja meio duro. Talvez isso se deva ao fato de a comida ter sido preparada pelos guias Mario e
Ricardo, uma vez que Fred, super indisposto, foi obrigado a se recolher a sua
rede lá ficando o coitado, ajojado, o resto do dia. Às 20 horas faz-se silêncio no acampamento, após a algazarra
habitual dos belgas e franceses. Ponho a cabeça pra fora da barraca e sou recompensada com o espetáculo de zilhões de estrelas piscando no céu.






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