Às
vezes me dá uma baita preguiça de organizar as viagens, talvez por isso ano
passado não tenha feito nenhum trek. Claro está que também influiu a alta do
dólar inflando o real de tal modo que nada mais restou de realeza na moeda
pátria. Bueno, há um par de anos, Orlei Junior, profe de escalada, numa
daquelas conversas que se tem ao pé duma parede enquanto estamos nos equipando, na ponta dos cascos, prontos pra trepar nas pedras,
acenou com tentadora proposta de rapelarmos o Salto Angel, maior queda d’água
do planeta. Contudo, a ideia não vingou. No final do ano
passado, Dib,
fotógrafo especializado em trips de aventura, enviou um convite via FaceBook
pra eu participar duma expedição fotográfica. Sabe pra onde? Pro Auyantepui
donde a cachu se lança numa verticalidade de 979 m parede abaixo!!! Não
hesitei, aceitei o convite no ato. Depois que me pus a pensar na magnitude de
tal indiada. Infelizmente, a trip não decolou por falta de quórum mas a essa
altura eu já estava tão super mega pilhada - até vídeos sobre o assunto já
curtira no youtube – que contatei uma agência venezuelana especializada nesse
tipo de turismo de aventura. Ficou então acertado que eu me juntaria a um grupo
de belgas que partiria de Caracas em 6 de fevereiro e de lá rumaríamos até o Parque
Nacional Canaima onde a aventura teria início. Embarco, assim, na quinta, por volta das
13 horas, num avião da Copa, com conexão no Panamá, chegando em Caracas
passados 15 minutos da ½ noite. Quando da aterrissagem já dá pra perceber,
embora noite, que a cidade, situada a 900 msnm, é rodeada por montanhas. Um
alívio sair da cabine refrigeradésima do avião pro calorzinho gostoso da
capital venezuelana. Henry Gonzales,
dono da Explora Treks (http://exploratreks.com/), aguarda diante do
portão de desembarque segurando plaquinha com meu nome. Afinal, não nos
conhecemos ainda. Deixa-me no hotel, localizado no bairro Palos Grandes onde fico,
bem baixada, na cama, durante a manhã, assistindo ao canal estatal Telesur que,
disciplinadamente, alimenta o culto à personalidade do falecido presidente
Chaves. Somente na China, à época de Mao, e agora na Coreia do Norte, se
encontra algo comparável. Almoçamos eu e Henry, num restaurante popular, um
combo com direito a prato principal, água ou suco, mais sopa ou sobremesa.
Escolho suco e iogurte. Tudo muito gostoso, bem caseiro; a acidez do iogurte na
medida certa. Palos Grandes é bairro de classe média alta, bem movimentado,
com trâfego de carros intenso. Os caraquenhos usam e abusam da buzina já que não
há punição, como no Brasil, para tal espécie de infração. À tarde, Mario, um dos guias que
participará da expedição, vem me buscar para eu conhecer o cerro Avila que
havia entrevisto do avião quando da aterrissagem. O Avila é um dos cerros que compõe o
Parque Nacional Waraira Repano ou Parque Nacional El Ávila, minicordilheira com 80 km de extensão e 16
km de largura cujo ponto mais alto é o Pico Naiguatá com 2.765 msnm. Há várias
entradas para se acessar o parque. Em sendo assim, o guia escolhe subir pela Sabas
Nieve, onde dois militares (um homem e uma mulher) da Guarda Nacional vigiam o
lugar de fuzil em punho. A acintosa vigilância tem como causa o aumento crescente
de roubos que flagelam os venezuelanos nesta tormentosa crise por que
passa o país. Tão tormentosa a situação econômica que itens básicos de alimentação se tornam escassos nas prateleiras dos supermercados. Daí por que os assaltos
às cozinhas das residências são cada vez frequentes!! E quem sai dos mercados com suas sacolas frequentemente se vê espoliado de suas compras. A
trilha é freqüentada por dezenas de pessoas que se exercitam pelas íngremes
encostas. Paramos no mirador onde conheço a simpática e falante Edith,
colombiana que veio pra Venezuela quando o país usufruía de boas condições
econômicas.
Nos dias atuais, ironicamente, quem goza de prosperidade é a Colombia. Ela inicia
o papo convidando-me a provar dum picolé de tamarindo, guloseima super
apreciada na cidade. Conta que vive no bairro Califórnia e revela, sempre
sorridente, que gosta muito de bailar. Maliciosa, esclarece que sambar “es como
matar cucarachas” e dá risada quando evoca a imagem da popular dança brasileira.
Tenho de rir, porque os passos miúdos do samba são um contraponto ao bailado
esparramado dos ritmos caribenhos. A pele lisa de Edith é invejável,
considerando que se encontra na faixa do 50 e tantos anos. Também, pudera, com
toda essa ascendência indígena! Podicre, quero ser índia noutra encarnação!
Todas as pessoas com quem converso se queixam espontaneamente da violência sem
que eu precise puxar assunto. Sinto que estão transbordando de indignação.
Mario explica que o pífio salário mínimo – em torno de 20 dólares – “menor que lo
de Cuba”, faz com que muitos caraquenhos prefiram assaltar a trabalhar. Isso
porque - pra comprar um calçado - é necessário economizar durante 10 meses! Caminhamos um
pouco pelo elegante bairro de Altamira cujas
casas e edifícios luxuosos denotam
o alto poder aquisitivo de seus moradores. Não vejo mendigos nas ruas tampouco
gente caminhando neste agradável bairro sombreado por alamedas de árvores. Entocados, os
venezuelanos, da classe baixa à alta, todos estão com medo! Diante de
tantos relatos assustadores de violência urbana, mais assustadores que os existentes
no Brasil, opto por permanecer na segurança de meu hotel onde janto um
fettucine al sugo, muito bem feitinho. De bebida, escolho rum a las rocas, que
significa com gelo, hehe (on the rock, tá ligado?). Em Roma como os romanos, já
que nesta zona do Caribe são produzidos os melhores runs do planeta. O difícil
é ficar numa dose só porque essa bebida é assanhada de boa! E pega rápido que
nem dengue em país tropical.



Um comentário:
Belo passeio minha amiga, vai ficando mais calejada, para um dia podermos fazer um ciclo-turismo gaudério.
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