terça-feira, 15 de novembro de 2011

Trongsa

Deixo Bumthang em meio a despedidas calorosas das quatro garçonetes que me atenderam durante minha curta permanência na pequena vila. A amabilidade delas é fruto tanto de suas naturezas meigas, dum dever profissional e ainda duma vivaz curiosidade pelos turistas. Distribuo beijocas e desejo tashi delek a todas elas, incluindo o simpático gerente, rapaz deveras atencioso. Após uma hora de viagem, uma placa no meio da estrada avisa que por 2 horas está interrompida a passagem em razão de reparos que estão sendo feitos mais adiante. Uns poucos veículos atrás de nós aguardam também. Um deles é um miniônibus com uma galera que retorna dum trek de 30 dias. A friaca e a chuva miudinha não impedem os jovens de armarem uma fogueira na beira da via. E ninguém parece se importar com a imprevista pausa. Logo surgem batatas postas sobre as brasas. Após assadas, são distribuídas, recebendo eu também uma. Um dos rapazes pergunta de onde sou, tecendo o inevitável comentário “Ronaldino” quando sabe que sou from Brasil. Com outro, travo um bom papo. Ele conta que trabalha como ator numa companhia teatral em Timphu. Como eu, gosta de plantas e me ajuda a nomear algumas em meu computador. Conta que a maioria da população prefere a monarquia ao parlamentarismo. No imaginário popular, o pai do atual monarca, adorado pela população, é o cara porque foi responsável por várias benesses como saúde e educação gratuitas. Os butaneses têm receio de que o primeiro-ministro nãos seja tão generoso quanto o 4º Rei. E a prosa ajuda as 2 horas a transcorrer agradavelmente. Por mim, poderia ter sido até mais longa a tal interrupção de tão bom o astral! Estranho que Jamyang esteja super quieto e o questiono. Ele deixa escapar que está curtindo aquela ressaca. Pema faz hehe quando ouve. Pergunto quanto bebeu a noite passada. Confessa que foram 4 copos de ara e 3 cervejas! Bem que eu desconfiava que ele era chegado a um tragoléu! A estrada super enevoada faz com que Pema dirija com cuidado redobrado. Ele conta que mesmo quando está numa estrada reta não ultrapassa os 80 km. Às 13 e 10 chegamos em Trongsa com tempo ainda bem ruim. Cheia de ladeiras, Trongsa tem um comércio viçoso. Cidade natal de meu guia, Jamyang vai almoçar com sua avó, deixando Pema cuidando de mim. Assim, eu e o gorducho motorista, mascador contumaz de dhoma, entramos num restaurante localizado na rua principal. Escolho uma comida bem típica. Num prato raso, uma porção generosa de arroz, ao passo que num pote menor, carne de yak bem apimentada. Peço ainda o tal leite azedo de yak. Já a carne de Pema são rodelas de toicinho, iguaria muito apreciada no país. Jamyang retorna de seu almoço pra me levar a passear. Indagado se a avó mora num dos vários edifícios espalhados pela town, responde não. Acrescenta que por ela não ter muito dinheiro vive numa casa. Visitamos então a Torre, o museu da dinastia Wangchuck, situado numa bela construção redonda formado por vários pisos ao redor dum espaço interno vazado. Como são proibidas fotos, sou obrigada a deixar a máquina fotográfica na portaria...merrdaa!! O museu é bem legal. Além de objetos relacionados aos reis butaneses, exibe ainda lindas estatuetas de Buda e do guru Rinpoche em suas diversas formas. Numa sala, assisti a um documentário sobre o Butão. Do último piso se tem uma esplêndida visão de 360º dos arredores. Vislumbro assim terraços destinados a plantações de arroz e o estreito rio Mangdy Chhu onde em uma de suas margens avulta o portentoso Trongsa Fortress. Ao longe, no topo duma colina, as adejantes bandeiras de orações pregadas em longos mastros de bambu. Tamanha a importância de Trongsa entre os 20 distritos butaneses que o monarca antes de ser coroado rei é ungido senhor de Trongsa. Saindo da Torre, a próxima visita é ao Fortress. Ainda bem que o chuvisco deu uma estiada. Descemos uma longa escadaria que conduz o enorme edifício. Similar ao de Punakha, tem aquele estilo fortificado, em que janelas pequenas são abertas na parte superior de altas paredes brancas. Um peludo cachorro dorme na soleira da porta dum dos templos existentes no interior da enorme construção. Macacos passeiam nas traves do teto! Um monge aprendiz quando ouve o badalo do sino, avisando das preces vespertinas, sai em louca disparada. O tal de Norling Hotel é o pior dos que me hospedei. O quarto cheira a desinfetante e o refeitório a fritura. Não só os árabes comem com as mãos. Os butaneses, idem. Conforme Pema, a comida assim fica muito mais saborosa. Quando estão com turistas, entretanto, usam talheres. Já deitada, escuto o barulho forte da chuva caindo lá fora. Não custo muito a pegar no sono. Andar de carro cansa a beça!!
Saímos de Trongsa às 6 da manhã duma terça enevoada. O lusco-fusco da madrugada dá um ar espectral ao vale do rio Mandgye Chhu. Durante a viagem, o mau tempo se mantém e a cerração vez por outra dá pinta na estrada. Macacos pendurados nos galhos das árvores fogem quando tento fotografá-los...merrrdaaa!! quando passamos por Punakha, Pema pára o carro no mercado e compra dois sacos de makhu. Esta especialidade, típica de Punakha, é feita de arroz. Tem o formato de pastel, porém sem recheio algum. Chegada em Timphu às 13 e 40. Confusão quando Jamyang tenta me instalar num hotel sem internete. Recuso veementemente. Voltamos pro carro e Jamyang enlouquecido ao celular tenta descolar outro já que os bons estão lotados. Enquanto esperamos a resposta de algum hotel, Jamyang me leva numa loja de artesanato. Compro presentes pra 3 anos! Bueno, afinal tudo se ajeita! Sou acomodada num hotel que se não tem internete no quarto, tem no refeitório onde me instalo até tarde da noite, baixando fotos e conversando no FB com amigos e bebendo uísque butanês. Tão bom que bebo três copos! Chego a conclusão que o melhor amigo duma mulher solitária não é mais o cabelereiro ou o costureiro e sim um notebook plugado na internete e um bom trago ao lado!

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