domingo, 6 de novembro de 2011

Envolta em brumas!

Se dentro da barraca está 0ºC, nem gosto de pensar quanto faz lá fora. Taciturna paisagem esta: céu cinzento da manhã à noite!! Desde que carquei meus pés neste país não peguei um dia sequer de sol a valer. E agora fudeu tudo mesmo! Tá nevando forte em Bhonte La (4.890 m), Takhunk La (4.520 m) e Thombu La (4.380 m), os três passos que se situam ao longo da tal trilha alternativa, a Yaktsa. Uma pena esta merda de tempo. Liquidou totalmente com a chance de eu avistar o Jomolhari. E somos obrigados ainda a percorrer a mesma trilha palmilhada há 2 dias atrás. Assim, eis-nos rumo a Thangthangkha, atravessando os já conhecidos vales de Dangochang e Takethang. Não que me incomode muito, mas que seria bom ter dado a tal banda por uma trilha desconhecida, ah, seria, sim!! Durante a caminhada no vale, no alto duma stupa, um falo feito em argila avisa que o local se encontra protegido dos demônios. Como os budistas são supersticiosos! Não imagina isso, não! Ao passar por uma propriedade de pastores, não resisto e entro dentro do quintal ao ver uma mulher acocorada diante duma nak tirando leite. Só pra especular como é o leite. Mais espesso e sem espuma do que o da vaca...pronto, satisfeita está minha curiosidade! Reza a crença, conta Jigme, que, quando se vê uma mulher tirando leite deste animal, algo auspicioso poderá acontecer. Será que o tempo vai melhorar e poderei ver alguma montanha?! Percebo Jigme diferente comigo. Responde às minhas perguntas com certa reticência, quase má-vontade, diria eu. Não deixo pra depois e resolvo questioná-lo. Ele com ar magoado explica que Wangyel (ah, os solícitos amigos!!) disse pra ele que eu havia dito que não confiava mais nele, Jigme. Ai ai ai....deve ter sido algum mal-entendido por causa deste maledeto idioma, o inglês, que não entendo muito bem. Trato de consolá-lo, garantindo que confio nele, sim! E que deixe de ser bobo! Como cachimbo da paz, distribuo chocolate e balas de menta que ele adora (durante o trekking tem sempre me oferecido das suas). Desfeito o mal entendido, prosseguimos nossa caminhada, deixando pra trás os amplos espaços, percorrendo agora uma estreita trilha aberta no sopé duma encosta de montanha. Após meia-hora de caminhada, já no interior do bosque de pinheiros, minúsculos flocos de neve deixam os galhos das árvores enfeitados de branco, alguns exibindo lindos formatos de estrelas. Perto de de Thangthangkha, há um posto militar cuja razão de existir se deve à proximidade da fronteira com o Tibete. Ali estão aquartelados não só militares butaneses como indianos. Com Forças Armadas insignificantes, não resta outra alternativa ao pequeno país do que se deixar ser protegido da China pela Índia! Quando passamos por Thanghthangkha, onde não poderemos acampar porque o lugar será ocupado pelos hóspedes do irmão mais moço do rei, um cartaz sobre uma pilha de lenha avisa “this wood is only to the VIP”. Hahahah!! Essa é boa!! Bem que eu queria ser hóspede real também!! Em consequência, nossas duas barracas voltam a ser montadas pela segunda vez ao lado da já familiar stupa. Como nosso acampamento é doutro lado do rio, situado num pequeno outeiro, vejo passar lá embaixo os tais convidados reais. A comitiva conta com 50 mulas, dezenas de serviçais e guarda-costas de carabinas em riste! Entre os convidados - todos jovens – não se encontra o nobre anfitrião. Agora 17 e 10 neva pra caramba! Tá muito frio e acho que vai ficar pior. Quando vou jantar, flocos espessos caem sobre mim enquanto me dirijo à barraca-refeitório. Chego quase a enterrar o pé na neve fofa que cobre completamente o chão. Durante a janta, aproveito pra indagar de Jigme sobre drogas na sociedade butanesa. Sem fazer segredo, conta que a mais consumida é a maconha, ilegal, embora cresça naturalmente por todo o país! Se quem for pego fumando um baseado, for menor de 18 anos, leva uma tremenda duma reprimenda. Se maior, prisão, com máximo de 3 anos. Pra estes há a possibilidade de ter a pena reduzida, caso possam pagar uma multa em dinheiro. O valor é destinado àquelas pessoas super necessitadas. O consumo de cocaína, como é de se esperar, agita as classes altas. E rola alcoolismo, sim, no país que se gaba de cultivar a Felicidade Interna Bruta!

Um comentário:

Miriam Chaudon disse...

Que pena que mesmo felizes(?)os butaneses precisem de drogas....que droga!