Embora não chova, o dia amanhece, parcialmente, nublado. Vou conhecer o Passo Khunjerab e por isso saímos às 8:20 de Karimabad. A viagem segue pela onipresente KKH e durante um bom trecho do percurso colorem a paisagem os verdejantes terraços onde brotam plantações de cereais e verduras. À beira do rio Hunza, sucede-se um vilarejo após outro com suas rústicas casinhas de pedra ou adobe. Após duas horas de viagem, do outro lado do rio, destaca-se um impressionante conjunto de montanhas, denominado Passu Cathedral, cuja forma assemelha-se à de uma gigantesca igreja em estilo gótico. Conforme avançamos rumo ao norte, este colossal maciço rochoso ora posiciona-se bem à nossa frente ora à direita. À esquerda, passamos pelo glaciar Batura que, qual uma gigantesca impressão digital, borra de branco o cinza do terreno pedregoso. Entramos no Khunjerab National Park às 11 horas. Este parque, o terceiro maior do país, cujo trecho pertence à rota da seda, foi, no século XIII, percorrido pelo mercador veneziano Marco Polo em suas peripécias pelo continente asiático. Trata-se de um desfiladeiro de escarpadas montanhas acinzentadas por onde flui o estreito rio Khunjerab. À medida que nos aproximamos da China, o relevo suaviza-se, e ainda que ganhemos altitude, as montanhas não são tão empinadas quanto as de Hunza Valley. Já não é mais aquela paisagem áspera quando se entra no parque. Seus topos e encostas, quando não encobertos de neve, apresentam-se atapetados por uma veludosa camada de grama. Lembram, por mais absurda que seja a comparação, as coxilhas gaúchas. Agora, estou na fronteira com a China, numa altitude de 4.700m. Um marco escrito em caracteres chineses assinala o limite entre os dois países. Distante uns 400 metros, há um edifício de concreto (deve ser a aduana) onde no topo a bandeira vermelha, com suas cinco estrelas amarelas, tremula ao vento. O céu, cinzento de nuvens, não deixa entrever qualquer rasgo de azul. Um frio horroroso. Chove e neva. Meus dedos sem luvas ressentem-se doloridos. A coloração do rio Khunjerab de bege passou a verde clara. Um grupo de jovens estudantes paquistaneses, também em visita ao lugar, pede pra tirar fotos comigo, um de cada vez: são três. Siddique, sorridente, nos clica pacientemente. Eles, não contentes, exigem nova foto, dessa feita, nós quatro juntos. Na volta, peço para pararmos (estou apertada pra fazer xixi) e descubro, observando Aqbar acocorado, um pouco mais além, que os homens, quando vestem as roupas típicas, fazem xixi igual às mulheres! Hahahahaha.....essa é boa! Meio cochilando, me dou conta de que o carro abandonou a KKH e sobe por uma estradinha de terra. Siddique avisa que vamos conhecer o lago Borith onde há um restaurante às suas margens. Pedimos chá com leite e ficamos, por uns 45 minutos, curtindo a paisagem, já totalmente desanuviada, revelando um céu azul claro. Já na van, rumo a Karimabad, Siddique ordena a Aqbar que estacione junto à beira da estrada onde um homem vende damascos secos. O guia oferece-me e eu provo: são uma delícia. Chegamos em Karimabad às 18 horas e minhas pernas doloridas - também pudera, um tempão paradas - exigem, urgentemente, exercício. Assim, me toco pra lan house. Nem dez minutos lá, checando meus emails, e, ploft, apagam-se os computadores. O atendente, um magrinho de fala melíflua, corre esbaforido de seca pra meca, tentando resolver a situação. Solícito, vem até minha mesa e avisa que em 5 minutos tudo se solucionará (dessa vez não foi corte de energia, garante, mas o gerador que pifou, acrescenta, fazendo um ar condoído). Após o retorno da luz, ele encosta-se à minha mesa e, juntando as mãozinhas em prece, suplica, revirando os olhinhos, que eu escreva, sei lá prá quem - às autoridades (?) (continuo não entendendo lá muito bem o inglês dos paquistaneses) - para que invistam mais no setor energético ao invés de nas bombas atômicas. Ontem, ele já protagonizara uma cena meio bufonesca (tive de me controlar pra não cair na risada) quando, pra reforçar que sesteara após o almoço, teatralizou a cena (!), juntando as palmas das mãos e colocando-as, ato contínuo, delicadamente, sob uma das orelhas. Uma figuraça ele!! Desisti de continuar escrevendo meus emails porque novo corte se impôs 10 minutos após o primeiro. Como o atencioso homenzinho não tinha troco, avisou que eu poderia pagar amanhã quando retornasse à loja. O gentil homuncúlo é despreocupadamente confiante...que gracinha!
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