quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Saltando de pedra em pedra

Na manhã ensolarada que paira sobre a pitoresca Igatu, junto-me ao grupo com que vou conviver durante 4 dias. Assim conheço o casal Andre e Carol, paranaenses, que deram um pit stop em suas atividades profissionais pra se aventurar numa climb trip. Daí o motivo de há 4 meses estarem carcando a sapatilha em alguns points clássicos de vias esportivas e de boulders, encontradas em São Paulo, Minas e agora Chapada Diamantina. O quarto membro do grupo, Vinicius, o mais jovem dentre nós, um descolado paulista, dono dum hostal em Sampa, é adepto de práticas espirituais alternativas, dentre elas o xamanismo. Além de Dmitri, nosso guia, faz parte do staff, Marcelo. Quieto, este paulista, radicado na Bahia desde tenra idade, está quebrando um galho pra Dmitri de quem é amigo, servindo de "mula" pra mim. Saímos de Igatu às 9 e 30, contemplando um céu azul onde pairam aqui e acolá nuvens cuja aparência remete a gigantescas bolas de algodão. Chego a assobiar tão contente estou!! Também pudera, esta pernada me fará conhecer certos trechos da parte oriental da serra do Sincorá por onde desfila o sinuoso rio Pati. Ainda próximo a Igatu, Dmitri aponta tocas de diferentes tamanhos, resultado da ação de diversos agentes erosivos nos ásperos e escuros paredões rochosos espalhados ao longo do caminho. Usadas como moradias pelos garimpeiros durante a época áurea da extração de diamantes, ocorrida no século XIX, ainda hoje são usadas por ene motivos. E Dmitri não se fez de rogado quando, certa feita, passando por um período de vacas magras, tomou como residência uma dessas tocas. Aleluia àqueles que gozam de criatividade, são descolados e não temem ousar. Esses jamais se apertam, hehe!! Dentre as várias tocas, destaca-se a do Badega, circundada por um pequeno pomar plantado por este garimpeiro. Bromélias de linda coloração amarelada e paus de mocó, cujas flores brancas com miolo amarelo encantam pela perfeição de seu desenho, dão pinta na trilha. Claro que paro pra fotografá-las e, faceira, disparo cliques diantes delas. Nem me importo em ser deixada para trás pelo grupo que, com passo apurado, dispara sendero adiante. Ultrapassada a lapa do Angico ou do Lapão, graças às excelentes condições de visibilidade, é possível enxergar no fundão do vale do Pati, à esquerda, a imponente formação rochosa do Castelo. O rio Paraguaçu, devido à distância, mais parece um escuro risco tão estreito se revela. Muito tri esse fenômeno da perspectiva. Cria maravilhosas ilusões de óticas, distorcendo abusiva e despudoradamente os objetos observados. Tenho assim uma excelente panorâmica desta serpenteante língua líquida rumo ao seu inexorável deságüe na baía de Todos os Santos. A vocação diamantífera da região resta comprovada quando, ao percorrermos um trecho de mato, exsurgem do solo milhares de pedacinhos de quartzo branco brilhando à luz do sol. Uma subida atravessando campos rupestres nos deixa no topo da rampa do Caim. É o momento cascudo do dia, segundo Dmitri. Cuida-se duma descida duns 3 km. Baixamos sem pressa, parando algumas vezes pra fotografar e curtir o visu do rio Paraguaçu e adjacências, motivo por que demoramos quase 2 horas pra percorrê-la. A trilha, atravancada de arbustos, capinzal, bromélias e pedras, que formam altos desníveis, exige algumas desescalaminhadas. Necessária certa cautela de modo a não se escorregar ladeira abaixo. A rampa do Caim finda na margem direita do rio Paraguaçu onde chegamos às 14 e 30. Todos se jogam na água com entusiasmo. Afinal, quem resiste, depois desse baita esforço físico sob um sol inclemente, em limpar o sal e o suor que deixa melado todo o corpo, não é mesmo? Devidamente refrescados, devoramos os super sandus de queijo, salame, alface, cenoura e azeitona. Pra beber, sucos de caju e cajá. Após um descanso de quase 2 horas, reiniciamos a pernada. Confinados que estamos no leito do rio Paraguaçu, o cenário agora é outro: a trilha, percorrendo uma das margens do rio, a da direita, é despida de vegetação, onde predominam largos e claros lajedos de rocha sedimentar. Aderente ao calçado, a chance de escorregar neste tipo de pedra é mínima, o que facilita a beça o pula-pula entre elas quando cruzamos até a outra margem. Uma caminhada curta e eis a nossa frente o enrosco do Paraguaçu com o Pati. Damos um baibai pro Paragua, já que nossa meta é subir seu afluente. Crivado de pedras - algumas verdadeiros matacões - o leito estreito do Pati, delimitado por paredões cuja altura calculo em torno de 400 m, escava uma garganta por onde desfilam, serelepes, suas limpídas águas apesar da enganosa coloração escura. Em ambas margens, cresce espessa vegetação em que se destacam arbustos e árvores de médio porte. Uma caminhada duma hora e meia finda numa toca, situada na sua margem direita, o que nos obriga a atravessar o rio novamente. Clara e espaçosa, a toca do Paredão, como é conhecida, debruça-se sobre um grande poço onde mergulhamos pra nos refrescar após a agitada caminhada. A tarde já exibe um céu bem nublado, indicativo seguro de chuva na região. Todos são unânimes em bivacar porque a toca, suficientemente larga, nos abrigará folgadamente caso os prognósticos de chuvaral se confirmem no decorrer do período. Simplesmente, estendo meu saco de dormir sobre a pedra, escapando – ebaaa!! - da aborrecida tarefa de ter de armar barraca. Dmitri revela-se excelente cozinheiro e serve uma ceia supimpa!! Nada mais nada menos que estrogonofe de frango, batata palha, arroz e salada de alface, cenoura e beterraba raladas, tudo coroado por lustrosas e verdes azeitonas. De sobremesa, chocolate e cocada preta mole. Vidinha mais ou menos essa hein?!! Nem a chuva miúda que começou a cair no início da noite serviu pra abalar os ânimos. Fui dormir feliz da vida. Adoro bivaque quando estou num clima quente!! É tudo de bom! Muito melhor que ficar encerrada dentro duma barraca sem poder ver a luz das estrelas.

Um comentário:

Miriam Chaudon disse...

Bea, ando atrasada com a leitura de suas aventuras, agora estou retornando aos poucos e lendo suas postagens anteriores também. Está ótimo o video! E a postagem também,como sempre com seu jeitinho especial de contar suas viagens.
Estou refletindo MUITO sobre o que me disse ontem na mensagem do Face...que bom tê-la como amiga!
Obrigada!
Beijos!!!