Tem chovido a semana toda, temperada ainda com vento e neblina. Há que se ter paciência pra fazer os Passadiços do Mondego, pernada que tomo ciência através de meu compadre Jean. Aproveitando uma trégua no mau tempo do outono, domingo, me mando pra lá. Os Passadiços
(integrados ao Parque Natural da Serra da Estrela e ao Estrela Geopark Mundial da UNESCO) são um percurso pedestre na Serra da Estrela com cerca de 12 km, que acompanha o leito do Rio Mondego, entre a Barragem do Caldeirão e a aldeia de Videmonte, no concelho da Guarda. O trajeto pode ser feito nos dois sentidos: Barragem do Caldeirão para Videmonte ou vice-versa. Se for feito na totalidade, demora entre 3 a 5 horas, consoante o ritmo e o número de paragens porque há miradouros e vilas ao longo do percurso. O grau de dificuldade "moderado", se deve à elevada quantidade de escadas. Como alternativa, é possível fazer parte do percurso através de um ponto de entrada/saída que existe em Vila Soeiro, tornando a pernada bem mais curta. Escolho pra começar a caminhada a Barragem do Caldeirão. Como inexiste condução pública, contrato um táxi que cobra 30 euros ida e volta (dá em torno de R$ 200,00). Considerando que o acompanhamento de guias é dispensável, tô no lucro. A barragem situa-se na ribeira do
Caldeirão pra onde foram desviadas as águas do rio Mondego, visando a construção o abastecimento de água e produção de energia elétrica para a região da Guarda. Na entrada, num stand de madeira, uma senhora confere no meu celular o ticket que havia sido previamente comprado no site dos Passadiços a 2 euros (em torno de R$ 13,00). Já de cara fico embasbacada com as bem construídas escadarias em madeira numa estupenda obra de engenharia. O trajeto acompanha o rio Mondego e com desnível acumulado em torno de 600 m, tem 7 km de escadas e pontes suspensas intercalado por 5 km de trilhas já existentes, atravessando bosques de pinheiros, azevinhos, azinheiras, freixos e castanheiros, exibindo ainda açudes, cascatas, moinhos,
engenhos e usinas hidroelétricas. A maior cascata dos Passadiços, conhecida como cascata Rosa, com 50 metros de altura e um grande poço que convida a um mergulho no verão, pode ser vista do mirante da Ribeira do Caldeirão. Nesta época do ano, vê-se o chão coalhado de castanhas, motivo por que é comum ver as pessoas portando cesto e sacos pra colher as frutas nas aldeias da região. Geralmente assadas na brasa, e, se acompanhadas, por um tinto sabem melhores ainda! Os passadiços passam pelas aldeias de serra de Pêro Soares, Mizarela, Soeiro, Trinta e Videmonte. Escolho conhecer Soeiro e Trinta mas nesta última fui dissuadida de entrar por causa dum cachorrão que latia e me lançava olhares furiosos. Como estou sozinha, prefiro não arriscar, vá que o animal se solte e avance em mim...hein!! Numa curva da estradinha, a pequena capela de
Nosso Senhor da Piedade, próxima à ponte da Mizarela. Feita em granito com arcos arredondados de sustentação, a ponte conduz à margem direita do Mondego. Um pouco antes de chegar no entroncamento que precede à entrada em Pero Soares, algumas casas exibem, em seus quintais, pés de macieiras verdes e vermelhas enquanto em outros há parreirais carregadinhos de uvas pretas. Opto por não entrar em Pero Soares até porque a placa indica que a vila está a 800 metros. Assim, continuo a trilhar os passadiços curtindo o contorno suave das serras. Após 2 km de pernada, vejo a placa indicando Soeiro a 500 metros e encontro uma aldeia mimosa com casas de xisto e granito e estreitas ruas em S. As oliveiras carregadinhas de azeitonas abundam no caminho que conduz à vila. Retorno à trilha principal avistando, infelizmente, ruínas de antigos lanifícios - aqui conhecidos como engenhos, como o da Fábrica Nova, construído em 1935, que ainda exibe a enorme roda de ferro que movia os teares, a Fábrica Velha, o Engenho da
Canada, Engenho Grande e do Pateiro, onde se fabricavam os afamados cobertores de papa. Aproveitando as águas do Mondego, em suas margens foram construídas usinas hidroelétricas, destacando-se a do Pateiro, a terceira do país a fornecer eletricidade à cidade da Guarda, no final do século XIX. Agora o barulhinho bom do Mondego faz coro ao ruído de minhas pisadas acrescido do chilrear do passaredo. Volto mais uma vez a pisar nas passarelas. Ao redor, as serranias arredondadas da serra da Estrela exibem ora a rocha exposta ora recoberta por uma película de cobertura vegetal. O ceu agora azul quase sem nuvens. Quando iniciei a pernada, ainda havia pequenos focos de cerração pairando sobre os vales. Ao longo do percurso há banheiros públicos (com papel higiênico, eba!) e pontos de wifi. Aliás, só compra cartão de internet na Europa quem trabalha ou é adicto como eu, porque até em pontos de ônibus rola wifi. Poucas pessoas cruzam por mim, o que me agrada, porque embora seja, aparentemente, sociável, sou um
tantinho misantropa...contradições de personalidade...fazer o quê, né? Pontes de arame sobre o rio Mondego levam o caminhante a trocar da margem esquerda pra direita e vice-versa. Que eu lembre, passo por 3 pontes de arame bem firmes sobre o Mondego. Por atravessar relevo acidentado, exibe o rio curso d'água ora tranquilo ora agitado devido a quedas d'água em seu leito. Fixadas nos corrimãos, placas amarelas metálicas indicam a quilometragem percorrida pelo caminhante. Ao atravessar um bosque de castanheiros, avisto uma tabuleta pendurada numa árvore indicando a venda de mel. Desço até a vendinha e bato um papo com o dono das colmeias, o apicultor Rui. Compro mel pra Bibi, que gosta de comê-lo até puro, e pólen, que vou levar pro Brasil. A parte final da pernada, que conduz à aldeia de Videmonte, é bem dura porque os degraus são a perder de vista, não acabam nunca....eita! Um pouco antes de eu começar a
árdua subida, encontro uma senhorinha muito simpática que está a vender marmelada. Muito contente quando sabe que tenho a mesma idade dela, 72 anos. Conta orgulhosa que já fez 2 vezes os passadiços! Acabo comprando um potinho deste doce, convencida por sua lábia de boa e persistente vendedora. Restam vestígios super antigos duma calçada romana e duma ponte medieval entre Pêro Soares e Mizarela. Na reta final da caminhada, construídos na margem direita dum afluente do Mondego, o Ribeiro dos Moinhos (lindas suas quedas d'água), vêem-se vestígios de moinhos que serviam pra moer os cereais
utilizados na feitura do pão. Aliás, em Videmonte, anualmente, realiza-se no início de agosto, o Festival Pão Nosso, que celebra as tradições rurais e o centeio, recriando o ciclo completo da produção do pão, desde o corte do cereal até à cozedura, com degustação de pão de centeio, bola de carne, música, danças e atividades que envolvem os visitantes, homenageando os antepassados e a identidade agrícola da região. Ao término da caminhada, tenho de andar mais um pouco até Videmonte onde combinei de o táxi me buscar. Ao longo da rua principal, curto as casas feitas de xisto, a tradicional fonte e sua bica mais a igreja matriz em estilo barroco. Como é domingo, só resta aberto o restaurante da Associação Cultural e Social da cidade. Peço uma bifana (vem a ser sanduíche de bife de carne suína servido no pão), acompanhada dum copito de vinho tinto. Sentada no terraço, a temperatura de final de tarde está amena, curto ao longe os passadiços. Aos poucos, os clientes vão aparecendo pra beber um vinhote, jogar damas ou conversa fora. Estou em paz...fecho de ouro prum dia tão especial!
(integrados ao Parque Natural da Serra da Estrela e ao Estrela Geopark Mundial da UNESCO) são um percurso pedestre na Serra da Estrela com cerca de 12 km, que acompanha o leito do Rio Mondego, entre a Barragem do Caldeirão e a aldeia de Videmonte, no concelho da Guarda. O trajeto pode ser feito nos dois sentidos: Barragem do Caldeirão para Videmonte ou vice-versa. Se for feito na totalidade, demora entre 3 a 5 horas, consoante o ritmo e o número de paragens porque há miradouros e vilas ao longo do percurso. O grau de dificuldade "moderado", se deve à elevada quantidade de escadas. Como alternativa, é possível fazer parte do percurso através de um ponto de entrada/saída que existe em Vila Soeiro, tornando a pernada bem mais curta. Escolho pra começar a caminhada a Barragem do Caldeirão. Como inexiste condução pública, contrato um táxi que cobra 30 euros ida e volta (dá em torno de R$ 200,00). Considerando que o acompanhamento de guias é dispensável, tô no lucro. A barragem situa-se na ribeira do
Caldeirão pra onde foram desviadas as águas do rio Mondego, visando a construção o abastecimento de água e produção de energia elétrica para a região da Guarda. Na entrada, num stand de madeira, uma senhora confere no meu celular o ticket que havia sido previamente comprado no site dos Passadiços a 2 euros (em torno de R$ 13,00). Já de cara fico embasbacada com as bem construídas escadarias em madeira numa estupenda obra de engenharia. O trajeto acompanha o rio Mondego e com desnível acumulado em torno de 600 m, tem 7 km de escadas e pontes suspensas intercalado por 5 km de trilhas já existentes, atravessando bosques de pinheiros, azevinhos, azinheiras, freixos e castanheiros, exibindo ainda açudes, cascatas, moinhos,
engenhos e usinas hidroelétricas. A maior cascata dos Passadiços, conhecida como cascata Rosa, com 50 metros de altura e um grande poço que convida a um mergulho no verão, pode ser vista do mirante da Ribeira do Caldeirão. Nesta época do ano, vê-se o chão coalhado de castanhas, motivo por que é comum ver as pessoas portando cesto e sacos pra colher as frutas nas aldeias da região. Geralmente assadas na brasa, e, se acompanhadas, por um tinto sabem melhores ainda! Os passadiços passam pelas aldeias de serra de Pêro Soares, Mizarela, Soeiro, Trinta e Videmonte. Escolho conhecer Soeiro e Trinta mas nesta última fui dissuadida de entrar por causa dum cachorrão que latia e me lançava olhares furiosos. Como estou sozinha, prefiro não arriscar, vá que o animal se solte e avance em mim...hein!! Numa curva da estradinha, a pequena capela de
Nosso Senhor da Piedade, próxima à ponte da Mizarela. Feita em granito com arcos arredondados de sustentação, a ponte conduz à margem direita do Mondego. Um pouco antes de chegar no entroncamento que precede à entrada em Pero Soares, algumas casas exibem, em seus quintais, pés de macieiras verdes e vermelhas enquanto em outros há parreirais carregadinhos de uvas pretas. Opto por não entrar em Pero Soares até porque a placa indica que a vila está a 800 metros. Assim, continuo a trilhar os passadiços curtindo o contorno suave das serras. Após 2 km de pernada, vejo a placa indicando Soeiro a 500 metros e encontro uma aldeia mimosa com casas de xisto e granito e estreitas ruas em S. As oliveiras carregadinhas de azeitonas abundam no caminho que conduz à vila. Retorno à trilha principal avistando, infelizmente, ruínas de antigos lanifícios - aqui conhecidos como engenhos, como o da Fábrica Nova, construído em 1935, que ainda exibe a enorme roda de ferro que movia os teares, a Fábrica Velha, o Engenho da
Canada, Engenho Grande e do Pateiro, onde se fabricavam os afamados cobertores de papa. Aproveitando as águas do Mondego, em suas margens foram construídas usinas hidroelétricas, destacando-se a do Pateiro, a terceira do país a fornecer eletricidade à cidade da Guarda, no final do século XIX. Agora o barulhinho bom do Mondego faz coro ao ruído de minhas pisadas acrescido do chilrear do passaredo. Volto mais uma vez a pisar nas passarelas. Ao redor, as serranias arredondadas da serra da Estrela exibem ora a rocha exposta ora recoberta por uma película de cobertura vegetal. O ceu agora azul quase sem nuvens. Quando iniciei a pernada, ainda havia pequenos focos de cerração pairando sobre os vales. Ao longo do percurso há banheiros públicos (com papel higiênico, eba!) e pontos de wifi. Aliás, só compra cartão de internet na Europa quem trabalha ou é adicto como eu, porque até em pontos de ônibus rola wifi. Poucas pessoas cruzam por mim, o que me agrada, porque embora seja, aparentemente, sociável, sou um
tantinho misantropa...contradições de personalidade...fazer o quê, né? Pontes de arame sobre o rio Mondego levam o caminhante a trocar da margem esquerda pra direita e vice-versa. Que eu lembre, passo por 3 pontes de arame bem firmes sobre o Mondego. Por atravessar relevo acidentado, exibe o rio curso d'água ora tranquilo ora agitado devido a quedas d'água em seu leito. Fixadas nos corrimãos, placas amarelas metálicas indicam a quilometragem percorrida pelo caminhante. Ao atravessar um bosque de castanheiros, avisto uma tabuleta pendurada numa árvore indicando a venda de mel. Desço até a vendinha e bato um papo com o dono das colmeias, o apicultor Rui. Compro mel pra Bibi, que gosta de comê-lo até puro, e pólen, que vou levar pro Brasil. A parte final da pernada, que conduz à aldeia de Videmonte, é bem dura porque os degraus são a perder de vista, não acabam nunca....eita! Um pouco antes de eu começar a
árdua subida, encontro uma senhorinha muito simpática que está a vender marmelada. Muito contente quando sabe que tenho a mesma idade dela, 72 anos. Conta orgulhosa que já fez 2 vezes os passadiços! Acabo comprando um potinho deste doce, convencida por sua lábia de boa e persistente vendedora. Restam vestígios super antigos duma calçada romana e duma ponte medieval entre Pêro Soares e Mizarela. Na reta final da caminhada, construídos na margem direita dum afluente do Mondego, o Ribeiro dos Moinhos (lindas suas quedas d'água), vêem-se vestígios de moinhos que serviam pra moer os cereais
utilizados na feitura do pão. Aliás, em Videmonte, anualmente, realiza-se no início de agosto, o Festival Pão Nosso, que celebra as tradições rurais e o centeio, recriando o ciclo completo da produção do pão, desde o corte do cereal até à cozedura, com degustação de pão de centeio, bola de carne, música, danças e atividades que envolvem os visitantes, homenageando os antepassados e a identidade agrícola da região. Ao término da caminhada, tenho de andar mais um pouco até Videmonte onde combinei de o táxi me buscar. Ao longo da rua principal, curto as casas feitas de xisto, a tradicional fonte e sua bica mais a igreja matriz em estilo barroco. Como é domingo, só resta aberto o restaurante da Associação Cultural e Social da cidade. Peço uma bifana (vem a ser sanduíche de bife de carne suína servido no pão), acompanhada dum copito de vinho tinto. Sentada no terraço, a temperatura de final de tarde está amena, curto ao longe os passadiços. Aos poucos, os clientes vão aparecendo pra beber um vinhote, jogar damas ou conversa fora. Estou em paz...fecho de ouro prum dia tão especial!
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