sexta-feira, 15 de junho de 2018

Abraçasso no Brasil 2018: Piauí - PN das Confusões

Sabendo que a maioria das pessoas tem equivocada ideia sobre a caatinga, abro esta postagem esclarecendo que este bioma, exclusivamente brasileiro, no período das chuvas, transforma-se numa exuberante floresta!! Das clássicas tonalidades de verde à ousada palheta laranja e vermelha, a vegetação exibe-se feérica. E como se não bastasse, matizes azulados e rosas nos arbustos floridos reforçam a explosão de cores. Quando as chuvas escasseiam, passa a ser mata branca denominada pelos tupis-guaranis caatinga. Uma lástima que este último cenário, o da vegetação seca, franzina, com domínio de cores neutras, tenha sido a preferência estética adotada pelo cinema novo e ainda insistentemente perpetuada em certas produções brasileiras da atualidade. Eu tive – aleluia - a benção de tê-la conhecido justo em sua feição colorida! Bueno, desfeito o preconceito sobre a caatinga, na sexta-feira, deitamos o cabelo (expressão nordestina que significa pé na estrada) pra Caracol, porta de entrada do pouco badalado Parque Nacional da Serra das Confusões, o maior do Piauí. Um horror a rodovia não porque tenha buracos ou outras deformidades e sim pelas malditas lombadas que infernizam com raras tréguas os curtos 88 km entre São Raimundo Nonato e Caracol. São muitos os povoados e cada um tem ½ dúzia desses calombos, alguns ilegais. Eu e Alu ficamos irritadíssimas porque a viagem que poderia ter durado nem 1 hora, levou 2!! E nem se fale em movimento porque se passavam outros veículos nem os notamos. Em Caracol, residem em torno de 10 mil almas. Seguindo a tradição nordestina, a pequena cidade se encontra toda engalanada pras festas juninas. Dessa feita, as bandeirolas, em verde-amarelo, são em homenagem à Copa do Mundo. Gosto de Caracol, ao contrário de São Raimundo, aqui me sinto aconchegada. No dia anterior, enviara um whats prum guia, recomendado pelo querido Curiólogo, acertando então a guiada. Marcamos encontro na praça. Só pelo jeito dele se aproximar do carro, sinto sua boa energia. E Jadiel foi outro que não me desapontou. Tranquilo, ficou encantado com a perícia de Alussandra no volante quando ela enfrentou certos trechos marca diabo da estradinha de chão batido. Ele nos leva até a pousada e restaurante da Edineia, onde vamos pernoitar. Neide, proprietária do estabelecimento, é bem falante. Conta que se divorciou do marido - nas palavras dela “um safado mulherengo” - e se tocou da Bahia pra cá onde montou seu negócio. Depois de deixar as bagagens no quarto, pegamos a estrada de chão batido que leva ao parque, parando antes numa casa de farinha onde ocorre o processamento da mandioca em seus principais derivados, farinha e goma. A mandioca juntamente com o caju é base de subsistência dos habitantes da região. A casa de farinha nada mais é que um espaço aberto coberto por um telheiro com poucas máquinas, todas rudimentares, cumprindo bem suas funções. A transformação do tubérculo em farinha e goma (os blocos de goma molhada parecem pedaços de argila) é totalmente artesanal. A primeira etapa consiste nas mulheres descascando as raízes uma por uma com a rapidez adquirida ao longo de décadas de prática. A última fase, a da obtenção da farinha, é cansativa e dura mais de 1 dia. Para tanto, pessoas se revezam enquanto mexem sem parar com uma comprida pá a goma espalhada sobre larga superfície ladrilhada aquecida na parte inferior por uma fornalha de modo que a goma perca toda umidade e se torne ultra fina. Iguaria apreciadíssima na mesa de qualquer nordestino pobre ou rico, notadamente, no café da manhã, os deliciosos beijus e tapiocas são o resultado final do processamento da mandioca. O Parna das Confusões, cujo bioma dominante é a caatinga, intercala ainda matas e cerrado. Visto de cima seu relevo arredondado formado pela Chapada dos Gerais assemelha-se a gigantescas e pétreas ocas. Circundam-no serras e vales cortados por desfiladeiros e canyons cujas paredes não alcançam alturas expressivas à semelhança do Parque da Serra da Capivara. Nas planícies, chamadas fundões, a vegetação abunda ao contrário da existente no topo das chapadas, como igualmente acontece na Serra da Capivara. Abriga também sítios arqueológicos com pinturas e gravuras rupestres, além de outros vestígios do cotidiano pré-histórico. Inicialmente, percorremos a trilha Cores da Caatinga, um bate-volta de 3 km, em meio a um bosque arbóreo-arbustivo cuja folhagem vermelha e amarela compete em colorido com dourado capinzal. O forte vento faz as folhas farfalharem de forma agradável enquanto caminhamos até o mirante Janela dos Sertões, extensa plataforma rochosa no topo duma chapada donde se avista extensa linha de serranias de coloração esbranquiçada separadas por capões ainda verdejantes. Jadiel explica que o nome Confusões se deve à desorientação provocada pela tonalidade uniforme das pedras. Isso fazia com que os tropeiros, confusos, se perdessem porque se tornava difícil identificar pontos de referência na paisagem. Vamos então visitar alguns sítios arqueológico, abrigados em baixões. No primeiro, as pinturas são “novinhas”, sua idade não passa dos 6 mil anos. O mais impactante de todos os sítios, pra mim, incluídos os da Serra da Capivara, vem a ser o cemitério na Toca Alto do Capim. Trata-se de pequena gruta, interior arredondado, distante 3 metros do solo, cujo acesso se dá por uma escada. No interior, em 4 ou 5 concavidades escavadas no solo, os pré-históricos depositavam seus mortos. Nas paredes ao redor das urnas funerárias, há desenhos de coloração avermelhada em formatos geométricos cujo significado ainda não foi desvendado pelos arqueólogos. Pra terminar a visitação com fecho de ouro, visitamos a deslumbrante Gruta do Riacho do Boi. Só a trilha que leva ao lugar já é um desbunde: começa no topo de ondulada e árida formação rochosa que mais parece um oceano de pedras! Como um passe de mágica, se desce por uma escada até um sítio super arborizado onde se localiza a impressionante abertura que na verdade é uma pequena caverna. Larga, com 100 metros de comprimento, a areia do solo é branquinha e fina que nem a de praia; de frestas no teto, escapam résteas de luz solar. Eu parecia criança pequena soltando ahs e ohs a cada passo que dava pelo encantador túnel. E me ponho a sonhar com essa gruta vazando luz em noite de lua cheia. Uma merda termos reservado apenas um dia pra conhecer a Serra das Confusões. Este parque merece mais tempo de visitação. Com certeza, voltarei, podicre!! Assim, no sábado, me despeço de Caracol porque é tempo de trocar Piauí por Ceará. Simbora, deitar cabelo de novo, Lulu!!

Um comentário:

Alu disse...

Viagem e relato incríveis, minha companheira de aventuras!! Simbora para nosso querido Ceará!;)