Saio de Barra Grande cedinho na sexta-feira e quando chego ao trevo cuja placa indica Parnaíba à direita e Jericoacoara à esquerda, estaciono no posto de gasolina ali localizado. Como não tomei café ainda, entro no restaurante ao lado do posto e peço tapioca com chá. Entabulando conversa com um senhor, descubro ser ele caminhoneiro. Pergunto se não sabe duma rodovia que vai até Piracuruca sem ser a BR 402 (já soubera da existência desse atalho em Luís Correia). Ele me ensina como devo proceder e depois de terminar a comida, sigo na direção indicada. Vou sem pressa porque a distância é curta, são apenas 190 km. Super linda a região perto de Cocal, pequena cidade à beira da rodovia, com uma linha de serras de encher os olhos. Depois dum tanto dirigindo nessa via entro então na BR 343 só parando em Piracuruca, uma das portas de entrada do Parque Nacional das 7 Cidades, atrativo turístico recomendado por minha prima Sonia. Ela teceu tantos elogios ao lugar que decidi dar uma conferida. Pequena, Piracuruca tem em torno de 27 mil almas. Dou uma banda pela cidade e perto da feira, na frente duma loja, uma banda de forró toca animadas canções deste estilo musical tão típico do nordeste. Visito 2 igrejas antigas, a matriz de Nossa Senhora do Carmo e a de Santo Antonio. A cidade enfeitada de bandeirolas se prepara para as festas juninas, consideradas no Nordeste mais significativas que a de Natal. Depois de me informar com os nativos qual rumo seguir pra chegar ao parque, pego a estrada Piracuruçá-Sete Cidade. Após dirigir 14 km num bom chão batido, vejo uma placa anunciando uma pousada. O portão está cerrado mas não dá nem 30 segundos aparece uma magrinha de nome Marci me comunicando que o lugar se encontra fechado. Faço uma cara de desconsolo e ela diz pra eu esperar que vai falar com a gerente. Resumo da estória, a gerente, Marcilene, permite que eu me hospede no Oca Tacarijus Eco Resort, antiga residência familiar transformada em hospedaria. Sou instalada num quarto espaçoso com ar condicionado. Pergunto se não há nada pra comer porque estou com preguiça de retornar à cidade, donde acabei de chegar! Prontamente, improvisam um almoço com pratos típicos - o caseiro deles, diga-se de passagem - que provo com muito gosto. As duas são umas fofas, gentis pra caramba. Como o calor é intenso, aproveito uma parte da tarde pra descarregar fotos e vídeos no notebook, após o que pedalo até o portão norte do parque – são apenas 4 km - mas não entro porque o horário de visitação termina às 17 horas, faltando apenas 5 minutos pra inteirá-lo. Tento achar a casa dum guia que me fora recomendado não lembro bem se por Nonato ou pela Fran, recepcionista da pousada nas Canárias. Como já anoiteceu e a estrada tá um breu, desisto e envio um whats quando chego na Oca pedindo pra que ele me guie durante os 2 dias em que pretendo permanecer na região. De janta, Marci prepara tambaqui grelhado com pirão....eba!! Estou eu passando a limpo algumas anotações do caderninho ao notebook quando um rapaz fardado de guarda se apresenta e declara, solene “sou Cristiano e vim fazer sua segurança”. Não atino com o motivo de tanta precaução porque o lugar mais calmo impossível. Dia seguinte, descubro o porquê: faz 1 mês assaltaram 2 bancos na cidade, explodindo com os caixas eletrônicos. Deve ser por isso, só pode! Putz, nem aqui nos confins do Brasil, a gente se livra dessa onda de violência, ala putcha! Conforme combinado via whats, apareço sábado na casa do Curiólogo às 9 horas. O tour será de bici no PN das 7 Cidades. Curiólogo, como ele se autointitula, tem como nome de batismo Osiel. O apelido Curiólogo, explica ele, resulta da mistura de dois traços de sua personalidade: curiosidade aliada à prudência. Muito engenhoso, o rapaz tá na faixa dos 30 e poucos anos. Conhece todos os cantos do 7 Cidades pois sua família vive no entorno do parque há 4 gerações. Com orgulho, salienta que qualquer trilha por onde se ande tem o suor de seu pai e de seu avô. Acrescenta que o parque é a sua grande casa geológica. O 7 Cidades, cuja idade varia entre 400 a 450 milhões de anos, discorre ele, tem origem na bacia sedimentar do rio Parnaíba. A flora predominante é a do cerrado, coexistindo manchas de caatinga e matas ciliares. O solo, por vezes, branquinho, exibe laivos brilhosos que denunciam a existência de quartzito. Uma pequena extensão do parque foi reservada à visitação, sendo dividida em 7 zonas ou cidades. Em cada uma delas, há interessantes formações rochosas. Algumas fazem jus, indubitavelmente, às suas denominações como a águia alimentando o filhote, os mapas do Brasil e do Ceará, elefantes, tartarugas e cobras. Outras, de tão abstratas, podem ser admiradas por ser aquilo que são, apenas belas pedras, ou o que mais os olhos desejarem ou imaginarem ser. A maior das cidades é a 2ª, apelidada por Curiólogo de a Capital porque há muito o que conhecer, como o Portal dos Desejos, um lindo arco de arenito, que também toma a forma da cabeça e tromba dum mamute, os sítio rupestres da Mão dos 6 Dedos e do Camaleão e o Paço da Biblioteca coroado por extensa pedra semelhante a uma gigantesca cobra, entre tantas outras esculturas rochosas. Na 4ª Cidade, conheço a gruta do Catirina onde o ermitão e curandeiro José viveu décadas com seu filho epilético. Dono de prosa fluída, Curiólogo conta diversas estórias sobre as pétreas figuras. Algumas fazem parte das lendas da região, outras, ele retira de sua fértil imaginação. Uma delas é a do moah. A lisérgica narrativa trata de seu telebate-volta à ilha de Páscoa pra trazer a gigantesca pedra.....a cavalo!! Encontro durante a visitação dois animados grupos formados por jovens estudantes. Um é de Teresina, o outro de Tianguá, cidade cearense distante 90 km. Entre as várias pessoas que passeiam no parque, destaca-se a neta do casal de cangaceiros, Lampião e Maria Bonita, Vera Ferreira. Ela como eu curte cicloturismo já tendo também pedalado Chuí- Montevideo. Convidada por Curiólogo, à tardinha, vou até sua casa. Ele e seu irmão, Edmar, construíram casas tanto no alto de árvores quanto sobre enormes rochas que abundam na propriedade. Do alto da engenhosa construção, encarapitada entre os galhos de frondoso jacarandá, curto incendiário pôr do sol. Tenho a satisfação de conhecer os ciclistas Galeno, este cego, e Marcos que vieram pedalando de Parnaíba a fim de participar da 1ª Pedalada no PN das 7 Cidades. À noite vou de carro dar um rolê em Piracuruca e aproveito pra comer um xis na lancheria Velho Oeste. Quando o atendente traz o sanduíche, me entrega um par de luvas de plástico pra que eu não suje as mãos....hahahaha. No domingão, participo da 1ª Pedalada no PN das 7 Cidades. Curiólogo juntamente com os demais guias e o diretor do parque abriram no mato do cerrado uma trilha de 12 km exclusiva para o evento. Embora plana, a trilha é bem ruinzinha, tipo single track pra nenhum galo cinza fodástico do pedal botar defeito. Após 1 hora e 4 km duramente pedalados, desisto e pego a estrada principal, um belo chão batido retornando ao local da largada onde se encontra a administração do parque. O lugar está cheio de ciclistas vindos de cidades vizinhas, de mais distantes e ainda do Ceará. Agradável surpresa constatar o excelente estado de conservação e manutenção deste parque nacional. Oxalá, todos fossem tão bem cuidados assim! Retorno à Oca e vou almoçar na área de lazer que conta com restaurante e piscina. Enquanto espero meu almoço, mergulho na refrescante piscina onde alguns nativos de Piracuruca também usufruem do espaço, aberto não só aos hóspedes como ao público em geral. Refrescada e alimentada, despeço-me das queridas Marci e Marcilene e dou uma passada no Curiólogo pra me despedir. Marcos e Galeno ainda estão lá esperando o sol baixar um pouco pra começar a pedalada de retorno a Parnaíba. Pego então o estradão que atravessa o PN das 7 Cidades, saindo pela portaria sul que conduz a Piripiri, limitando-me a contornar a cidade. O percurso à capital piauiense não passa de 170 km, assim consigo chegar a Teresina ainda com luz do sol. Escolho um bom hotel onde passo o restante do dia escarrapachada na cama vendo TV. O cansaço venceu o desejo de dar uma banda na cidade, porém o que vi de relance me agradou: largas avenidas, pouco tráfego e muita área verde. Amanhã, nova etapa da viagem inicia, dessa feita não mais só e sim em fina companhia!!
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