quinta-feira, 19 de julho de 2012

Só na espera....


Se Davi não tivesse me emprestado um saco de dormir extra, eu continuaria passando um baita frio à noite. Pela segunda vez, acordo com dor de cabeça durante a madrugada. Nem hesito, tomo uma pílula anti-soroche e vinte minutos depois a dor já era. Entretanto, tudo tem um preço: acordo pra fazer xixi 2 vezes!! Numa temperatura abaixo de zero não é nada agradável, podem crer! Meu consolo, ao sair do quentinho do saco de dormir, é olhar pra cima e curtir o sensacional espetáculo dos zilhões de estrelas cintilando no firmamento. Quando acordo em definitivo, me dou conta de que o final da semana está chegando....puxa, o tempo voa! A barraca, agradavelmente, iluminada pelos raios de sol, é um convite pra que eu fique mais um pouco deitada embora já sejam 8 da matina. Entretanto, aquele céu dum azul impecável me chama, me chaaama. E quando saio, sinto quão fria a manhã está, tanto que a água, que pinga da bica próxima ao nosso acampamento, se encontra congelada. E Patucci anuncia que seu GPS, durante a noite, marcou - 9ºC, no interior da barraca. Olha só como são as coisas na Bolívia. Marco Antonio, embora seja arquiteto, ganha mais trabalhando como guia. Até então eu que sempre pegara guias sem nenhuma instrução formal, salvo o conhecimento técnico de escalada, sinto prazer em poder bater papo de igual pra igual com um cara instruído que não te vê como mais uma turista assanhada afinzona duma trepada com um índio. Sim, há que se ter bastante cuidado em tratá-los porque de modo geral os guias são maliciosos e machistas. Marco Antonio - aleluia!! - por fim, desvenda a confusão nos nomes das montanhas do Condoriri. A discrepância existe em razão de nem sempre os cartógrafos seguirem a nomenclatura dada pelos nativos, que perpetuam informações ancestrais. Adverte o guia que, em caso de resgate, eles se orientam pela denominação dos moradores da região. Como amanhã é dia de cume, o treino de hoje será leve. Assim, nos dedicamos ao aprendizado sobre diversos tipos de nós que devem ser aplicados em situações que exijaam auto-resgate. A pausa pro almoço enche a galera de alegria! E não é pra menos! Afora sopa e salada, hamburgers de soja com batatas fritas! Feita a digestão, tratamos de pôr em prática os ensinamentos adquiridos na parte da manhã e vamos até um monolito rochoso, perto do acampamento, usar o prussik pra ascender pela corda, simulando que havíamos caído numa greta. A ancoragem, numa pedra, feita por Davi pra montar o top rope, é um milagre que só a física explica. Não à-toa, a formação acadêmica do cara é Física. Putz grila, esta minha cabeça de vento me deixa de cara. Não só os bastões eu esquecera no Brasil, também minhas calças isolantes. Portanto, dentre os itens alugados em La Paz, um deles fora um macacão. Acontece que o macacão veio bichado! Minha sorte, entretanto, foi que resolvi vesti-lo, ontem, quando fui treinar no glaciar. Assim, pude constatar dois defeitinhos nem tão básicos assim na vestimenta: o zíper da perna esquerda espanado (termo paulista que significa, trocando em miúdos, fodido) do tornozelo à metade da coxa e a ruptura dum dente da presilha que prende a alça direita. Desajeitada que sou, apelo ao infatigável Marski. Os guias são, por força da profissão, assaz habilidosos como venho constando. E Marski não me desaponta. Munido de agulha e linha, enjambra rapidinho uma gambiarra especial de boa na presilha arrebentada. Quanto à perna do macacão, envolve-a com fita adesiva prateada. Fica estilosíssima minha roupa! Pareço uma versão feminina anã do Robocop. Davi, por causa de suas habilidades na costura, é objeto de várias chacotas. Jamil, maliciosamente, anuncia cuecas rasgadas que necessitam duma costurinha. Pura inveja das prendas domésticas do Davizinho. Terminada a refeição, servida geralmente quando a escuridão se instala lá pelas 18 e 30, me recolho aos meus “aposentos”. Será uma noite curta já que acordaremos de madrugada pra fazermos o Alpamaio Chico. Numa barraca-refeitório próxima, a animação é grande: palmas vibrantes acompanham cantorias em alemão. Contudo, as 21 horas, reina o mais absoluto silêncio no acampamento-base. Nem o silvar das estrelas cadentes se escuta. É véspera de cume, gente!!

3 comentários:

Miriam Chaudon disse...

Trepada com um índio! Não imaginava isso....hehehehe! Tem turista prá tudo então!

ronie disse...

que maravilha! estou adorando....

aproveito para te passar aqui o link das minhas "melhores fotos", entre elas tem varias da Bolivia tambem...

http://www.flickriver.com/photos/roney/popular-interesting/

beijos
roney

Isabel disse...

Maravilha de relato e imagens, Cuca ! Me delicio com as suas histórias e descrições ! Estou me preparando para fazer esse mesmo tipo de passeios q vc faz, quem sabe a gente não se cruza por aí ? Beijão !
Isabel