segunda-feira, 4 de abril de 2005

Convento de Santa Catalina

Acordo bem cedo porque o guia vem me buscar às 8 da manhã pra irmos ao canyon Colca com pernoite em Chivay onde eu ficarei 2 dias. Enquanto espero, começo a sentir fortes dores na região lombar, na parte posterior do quadril esquerdo. Dom Carlo e eu pensamos que é pedra nos rins. Como a dor é realmente insuportável, cancelo a viagem a Chivay e vou consultar na Hogar Clínica San Juan de Dios. Em lá chegando, tratam como se fosse cálculo renal. Recebo de imediato Buscopan na veia e sei lá mais o quê. O exame de urina não acusa qualquer infecção. Vem o médico de plantão e conversa vai conversa vem, chega à conclusão que meu problema é na coluna. Entra em ação o ortopedista, Dr. Juan Alberto Zeballos que me conforta exclamando alegremente: gran deportista es esa señora! Diagnostica hérnia de disco. Volto ao hotel com recomendação de guardar repouso durante 2 dias. Caso melhore posso então ir na quarta-feira ao tão sonhado trekking no Colca. Na terça, acordo bem melhor mas não consigo ficar muito tempo sentada. Sigo então a sugestão de Dr. Zeballos e vou visitar o monastério Santa Catalina. Ah, esse convento de clausura é qualquer coisa de lindo! É uma cidadela que ocupa um enorme quarteirão, tendo sido fundado por freiras dominicanas no final do século XVI. Tem 3 claustros, 6 ruas, 80 casas que serviam de moradia às religiosas (em regra, quarto, sala para orações e uma cozinha, além de um pequeno jardinzinho, o que não deixa de ser uma suíte bem arranjadinha, não é mesmo?), uma praça, a igreja, o cemitério, um locutório (utilizaram na construção desta peça uma pedra que filtrava a luz do exterior de modo a impedir que se visse com nitidez o rosto das freiras) dotado de uma roda permitindo assim a troca de alimentos sem que houvesse contato físico entre os visitantes e as monjas. Todas as peças têm o teto abobadado. Afora o dote tinham as monjas de contribuir com alimentos para suas refeições diárias. Levavam ainda um enxoval que, entre outros itens, incluía objetos como travesseiros e 2 colchões (achei tão curiosa essa exigência!). As monjas se distinguiam entre as que usavam véu preto e aquelas que vestiam o branco. As que usavam véu preto eram provenientes da classe alta arequipenha e deveriam ser virgens. Mas a exigência da virgindade como um dos requisitos para o uso de véu negro se abrandava diante de viúvas e separadas que possuíssem grandes dotes a serem doados à instituição religiosa (ah, o poder do vil metal! Por supuesto derruba barreiras). Durante o noviciado, as noviças não podiam manter contato com amigos e familiares. Tinham direito a uma serva somente as monjas de véu preto. Já as beatas eram mulheres que, em tudo imitavam as freiras, sem contudo jamais lhes ser permitido o privilégio de professar os votos religiosos. Na verdade, os conventos eram lugares onde as mulheres desfrutavam de relativo conforto caso tivessem dinheiro para sustentar tais regalias. Se de origem humilde, suas habitações eram coletivas, sendo-lhes imposta a execução de serviços grosseiros. Às de véu preto eram reservadas tarefas nobres como a confecção de bordados delicados em vestes sacerdotais e àquelas destinadas às imagens sacras. As roupas confeccionadas por elas são lindamente enfeitadas com rendas e bordadas com pedras preciosas. Passeando pelas ruas daquela cidade-convento imagino como seria a rotina de suas moradoras: acordar cedíssimo, ainda noite escura, rezas, realizar as tarefas diárias, rezas, costurar, rezas, cozinhar, rezas, bordar, mais rezas, até que chegasse a hora de dormir (com certeza ainda dia claro, já que saiam da cama lá pelas 3 da madrugada) com nova bateria de rezas. Rola um boato - sem qualquer comprovação, viram? - de que elas sofriam de problemas nos joelhos, as coitadas. Imagino que se deva ao fato ficarem tanto tempo ajoelhadas entoando suas preces, pobrezinhas! As cores com que são pintadas as casas e ruelas passam do azul genciana ao amarelo, tornam-se brancas, e num arroubo mais circunspecto transformam-se em ocre, tudo muito, muito colorido apesar da austeridade do lugar. Canteiros e vasos de gerânios floridos enfeitam as vielas e os peitoris das janelas. Sinto ganas de aqui viver, o lugar incita mesmo à reflexão e desconvida à pressa ansiosa, um mal do nosso século. Eu aposto que se algumas das boas freiras sofreram de gastrite não foi causada pela ansiedade, e, sim, talvez, por comerem demais.

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