domingo, 3 de abril de 2005

Ciudad Blanca

Meu objetivo em ir a Arequipa é o de conhecer o canyon Colca, o segundo maior do planeta. Fazer um trekking lá e depois seguir até Atacama pra conhecer o famoso deserto chileno. Então saio de Cusco às 7 da manhã. Umas duas horas depois de iniciada a viagem, entram duas índias vendendo um pão redondo, bem quentinho e achatado, apontando o desuso do fermento na massa. Praticamente todos os passageiros compram pão. Sou só eu de turista no ônibus, o resto dos passageiros são peruanos. Senta do meu lado uma velha mulher vestida com trajes típicos. Não demora muito inicia uma conversa contando, orgulhosa, que vai visitar seu filho, muito bem estabelecido numa outra cidade, não muito distante de Cusco. Escuto a simpática senhora desfiando loas sobre seu rebento e com pena me despeço dela, vendo-a descer do veículo com certa dificuldade já que é muito gorda. E o ônibus para em várias cidades pegando e largando gente, mas era vapvupt, nem dava pra descer e esticar um pouco as pernas. Quando chega a hora do almoço, entram mais duas mulheres vendendo comida: pedaços de carne de porco assada e batata doce cozida envoltas em sacos plásticos (há dois tamanhos, um maior custando 3 soles e outro menor de 2 soles) mais um pequenito contendo um molho picante. Grande parte dos passageiros compra a comida e assim vão comendo, vagarosamente, usando as mãos, bem tranqüilos. Limpam as munhecas ora em guardanapos de papel ora nas próprias roupas, como posso bem observar. Não ouso comer tal alimento. Dessa vez banco a típica turista enojada, louca de medo que mais tarde possa me causar transtorno gastrointestinal. Vou beliscar algo só quando surge a oportunidade de descer numa das cidades por onde passamos, daí compro um pacote de biscoitos salgados. Durante a longa viagem (quase dez horas dura o trajeto Cusco-Arequipa) observo a transformação na paisagem: de Cusco a Juliaca, os grandes cerros cobertos de mata verdejante; a partir daí, as montanhas perdem altura, suas encostas suavizam-se e a vegetação rareia até ceder lugar a um terreno árido pontuado aqui e ali por cactos. Surge, então, Arequipa - um oásis encravado num vale de montanhas andinas desérticas - eleva-se a 2.300 metros acima do nível do mar. Em seu entorno, avistam-se três vulcões, o mais conhecido é El Misti. Os outros dois apresentam seus cumes nevados. A cidade é coberta por uma névoa que esmaece os contornos dos cerros que a cercam; muitos de seus edifícios são construídos com uma pedra de origem vulcânica, o sillar, cuja coloração branca produz um efeito luminoso quando neles incidem os raios solares. É uma cidade plana e como todas as cidades peruanas tem uma Plaza de Armas rodeada por prédios com arcadas (ironicamente esta marca espanhola na arquitetura reflete, por sua vez, os anos de dominação árabe na península ibérica) onde em restaurantes ao ar livre se desfruta o bulício da plaza e o verdor das palmeiras que a enfeitam. Num de seus lados, ergue-se, imponente, a catedral ocupando um quarteirão. No lado oposto, ergue-se, na esquina, a igreja da Companhia de Jesus com sua fachada em sillar ricamente esculpida. Como hoje é domingo, o movimento nessas duas igrejas é intenso e a plaza ferve de gente passeando por suas alamedas e sentadas em seus bancos. Observo que os habitantes de Arequipa são mais tranqüilos que os cusquenhos. Praticamente inexistem mulheres e crianças te abordando nas ruas, como em Cusco e Lima, com aquela arenga suave e constante tentando vender alguma quinquilharia. Os táxis entopem as ruas estreitas da parte histórica da cidade. Parece haver um veículo pra cada três habitantes. Espanto-me com a quantidade, será que os taxistas ganham um bom dinheiro com tal concorrência? Assim também os restaurantes, quatro ou cinco em cada quadra, com os garçons te aliciando pra degustar o arroz chaufa ou um ceviche. E as confeitarias, ah, as confeitarias! chamam a atenção com suas vitrines exibindo faceiros antojitos de arequipa (cones de papel pardo contendo bolachinhas recheadas com doce de leite), orgulhosos bolos coloridos, enormes, altos, enfeitados com casquinhas de sorvete recheadas com mousse, merengue ou nata, e....ah, sim, os trêmulos leches assados. Comi pelos olhos, e como!! Arequipa tem uma temperatura agradável nessa época do ano. Um solzinho gostoso produz um calor ameno durante o dia, permitindo o uso de bermuda e manga curta. Lá pelas quatro, cinco da tarde, o céu fica nublado e a temperatura diminui. Hora de trocar a roupa por outra mais quentinha. Volto ao hotel, coloco uma calça comprida, pego minha jaqueta e vou atrás de um restaurante pra provar os famosos ceviche e pisco sour, aliás, de-li-ci-o-sos!! Não é só japonês que sabe fazer peixe cru, não! No Peru (até que rimou, mas não era essa a intenção, viu?), fazem às mil maravilhas. Pra quebrar o sabor forte do peixe cozido no limão e temperado com sal e pimenta, surpreendam-se: deliciosas batatas doces cujo colorido fortemente alaranjado contrasta com a branca tessitura do peixe. Rebatendo tudo isso o gostosésimo pisco sour...dos deuses, gente, muchomucho bom (só bebo uma taça, quando viajo sou bem comportada). Durmo feliz e reconfortada nessa noite, sabendo que o dia seguinte irá ser melhor ainda já que eu irei lá pras bandas do Colca, onde os condores planam graciosamente sobre a grande garganta deste famoso canyon. Mal sabia eu que só o conheceria de fotos assim como muitos de vocês que me leêm....porém essa é estória pra ser contada outro dia!

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