Deixo
a ensolarada Las Palmas para trás ingressando numa acinzentada Lisboa. Desde
2006 não venho à capital portuguesa quando conheci o país num tour de 2 semanas
com minha mãe, percorrendo-o de norte a sul. Assim, eis-me aqui novamente pra revê-la
e saborear sua deliciosa culinária. Uma beleza esse novo sistema de visa da
comunidade européia. Qualquer país que você entre, a primeira carimbada no
passaporte vale pra qualquer outro sem necessidade de carimbar folhas e folhas do
documento a cada país visitado! Adotando o mesmo sistema de Barcelona, escrevo
email ao hotel português solicitando infos de sua localização. Dessa forma, após
descer do avião com minha maletinha de 10 kg, entro no metrô convenientemente
situado na saída do aeroporto. Feita uma baldeação, ops conexão (mais chique,
né?), em 20 minutos estou na estação Restauradores, distante 300 metros do hotel
por mim reservado. Como na Espanha aqui também há bikes e patinetes elétricos pra
alugar, dirigidos em sua maioria por jovens. Largo a maleta no hotel - são
apenas 16 horas - e saio pra dar uma banda. Tinha me esquecido de quão
encantadora é Lisboa! Que cidade fotogênica tanto que nem o tempo enfarruscado consegue
embaçar sua beleza. Tantas as opções de restaurantes no Rossio que fico meio
atarantada ao ler os menus afixados às portas dos estabelecimentos. Acabo por
entrar num bem simples e peço arroz de tamboril só porque o nome evoca - que viagem
– o tamborilar da chuva no telhado. O delicioso ensopado com peixe, amêijoas e
camarão vem acompanhado por arroz branco bem soltinho. O vinho, pois pois, é um
encorpado tinto português. Dia seguinte, vou a pé até a praça Martim Moniz e, enquanto
estou comprando a passagem pra embarcar no elétrico 28, o cobrador me alerta
"rápido que está vindo 1 manada", hahaha!!! O passeio que dura 1 hora
termina no campo de Ourique, em frente ao cemitério dos Prazeres. Refaço a rota
do bondinho a pé percorrendo, inicialmente, a Estrela onde entro numa
confeitaria e provo os orgasmáticos ovos moles de Aveiro acompanhado de um
expresso (ah, que experiência gustativa divina!!), passo pelo Chiado e pouca demora estou
atravessando a rua Augusta que termina no imponente Arco do Comércio. Almoço na
Baixa 1 leitãozinho à Bairrada, que vem a ser nosso porquinho à pururuca, cujo parceiro é o bom tinto português. O tempo tá esquisito com o sol mal dando
as caras no intervalo entre uma garoa e outra. Bem alimentada, subo a Alfama
até chegar ao largo de Santa Luzia donde se vê abaixo o amplo curso do rio ‘Tejo
exibindo-se não mais em naquinhos como até então o vislumbrara entre os vãos
das estreitas e tortuosas ladeiras lisboetas. Um músico turco dedilha o saz, instrumento
de cordas típico de seu país. Na parede externa da igreja de Santa Luzia, 2
enormes painéis em azulejos brancos e azuis reproduzem cenas da vida portuguesa
dos séculos passados. 100 metros além, outro largo, igualmente voltado pro Tejo,
o das Portas do Sol, hoje, entretanto, sem a presença da flamejante estrela.
Dali, vou até as muralhas externas que circundam o Castelo de São Jorge e num
trajeto de 200 metros escuto 3 manifestações musicais: desde a alegre cançoneta
do leste europeu, executada do alto dum balcão de uma casa centenária por 2 rapazes,
passando pelo africano tocando xilofone sob a sombra duma laranjeira, à audição
de jazz interpretada pelo jovem em seu saxofone. À noite, subo as ladeiras
que levam ao bairro Alto pra assistir a um show de fado vadio (assim chamado
quando os cantores são amadores) na tasca do Chico. O estabelecimento é pequeno
com poucas mesas tanto que permaneço a maior parte do tempo ao redor do minúsculo
balcão. O prato mais pedido do cardápio vem a ser o pirotécnico chouriço assado
grelhando sobre labaredas que ardem na pequena cumbuca de cerâmica. Vários artistas
se apresentam, com predominância de mulheres entoando o choroso estilo musical
(adoooro). Dia seguinte, encontro com a cearense Cristina, amiga duma amiga,
que aqui está a morar com o marido. Como eu não entrara ontem no castelo de São
Jorge, limitando-me a vaguear pela sua parte externa, pergunto-lhe se já o
conhece. Diante da resposta negativa, pegamos a escada rolante que liga a
Mouraria à Alfama evitando assim ter de subir as ladeiras que ligam um bairro
ao outro. Desembocamos numa rua chamada sugestivamente Calçadinhas da Costa do
Castelo. Embora a garoa não dê trégua, eu e Cris nem nos abalamos, seguimos
firmes e fortes porque não somos feitas de açúcar tampouco de sal. A paisagem
do alto da colina onde o Castelo foi erigido é magnífica. Avista-se a parte
antiga de Lisboa com seus casarios antigos encimados por telhados avermelhados
bem como o onipresente Tejo cortado ao sul pelos 2 km da ponte 25 de abril que
liga a capital a Almada. Nos jardins fronteiriços ao castelo, uma dezena de
pavões exibe suas magníficas caudas. O edifício foi construído no século XI pelos
mouros durante a ocupação na península Ibérica, onde reinaram durante 700 anos.
Restam preservadas 11 torres cujo acesso se dá através de escadas que terminam
nos chamados passeios de ronda pois por ali circulavam os soldados encarregados
da segurança do castelo. E nós fizemos também uma ronda – turística, é claro - ao
redor do castelo apesar de o vento estar soprando forte a ponto de revirar os guarda-chuvas.
Consigo evocar , neste breve tour, a magia daqueles tempos medievais, pra mim a
época mais interessante da História. Terminada a visitação, tratamos de
procurar um restaurante pois já são quase 17 horas e nem almoçamos ainda. A
essa hora não é muito fácil encontrar lugares abertos que sirvam almoço porque tanto
em Lisboa quanto na Espanha os bons restaurantes fazem intervalo de descanso
entre almoço e janta. Felizmente, encontramos um aberto e nos lavamos em
fartas porções de bacalhau regadas, pois pois, a vinho tinto. De sobremesa, um
pudim divino de laranja. E nós as duas, alegres, de pancinha cheia, descemos
a Alfama entrando na Sé, a imponente catedral da cidade. Faço os habituais 3
pedidos a que tenho direito, saindo do escuro templo pro lusco-fusco do fim de
tarde. Estamos tão contentes uma com a companhia da outra que resolvemos prolongar
mais a convivência entrando na charmosa enoteca Tábuas. Lá fora a chuva continua
a cair miudinha enquanto eu e Cris brindamos à vida e à recente amizade!
Um comentário:
Que belo Passeio!
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