Acordo
às 5 da manhã com o galo cocoricando a milhão, tarefa que ele cumpre
diligentemente até 8 horas quando então levanto e saio da barraca. Nem acredito
no que vejo: após 2 dias de céu nublado eis o sol exibindo-se meio sem graça,
mas não importa, tudo é melhor do que aquele ambiente cinzento que nos
acompanhou durante 2 dias inteiros!! No desaiuno, liquidamos o resto do queijo
que sobrara da janta. Os dois cachorros
de Feliciana espertamente estão sempre
enrodilhados diante do fogo de chão. Volta e meia ela ralha com Peluce, hilário! Aproveito que a fofa da velhinha está quietinha, mateando,
pra puxar conversa. Queixa-se de que o dedo envolto em curativo dói. Indago, então, como conseguiu se machucar. Ela responde que
rasgou o dedo num prego que prende a ferradura à pata do cavalo tentando sei lá
se tirá-la ou se tentando raspar o casco do animal.....coitadinha! Partimos sem
que eu consiga me despedir de Jose porque ele foi buscar mula e cavalo campo
afora, descuidadamente deixados soltos ontem à noite. E sabemos, depois,
quando o arriero telefona pra Fernando, que a demora foi bem mais duma hora até
resgatar os 2 bichos! Feliciana nos leva até o final do páteo e, na despedida,
lembra Fernando – pela décima vez, haja paciência - que não se esqueça de
transmitir ao filho as encomendas que o guri deve lhe trazer quando vier
visitá-la. Já afastados da casa, ouvimos sua vozinha fazendo as
mesmas recomendações:
"pilhas pro rádio, que o filho não esqueça de trazer". Um amor essa
Feliciana! Às 9:30 já nos encontramos subindo o morro e à medida que ganhamos
altura, aparece com nitidez a Quebrada Cuesta Grande e mais adiante a Quebrada
Calderilla. A manhã, embora muito fria, está estupenda, céu claro e um charmoso
colar de nuvens rodeia os cerros em frente. Paramos na Abra Sarapura onde há
outra casa pertencente à Feliciana. Um lindo gato cinza e branco, super
carinhoso, arqueia o lombo e se esfrega em mim, miando. Não deve estar mal de
ratazanas nesta banda porque o bichano se mostra bem nutrido. O visual daqui de cima
é estupendo, o mais bonito pra mim de todo o trekking. Dá pra visualizar o trajeto feito desde o 2º dia a partir da Abra de la Cruz e os cerros que se sucedem,
alguns deles formando outro tanto de pequenas quebradas. Porque distantes os mananciais de água, não se acampa neste posto. O que é uma pena porque
seria
beleza pura acordar e dar de cara com tal cenário! Do posto
Sarapura, percorremos, não por muito
tempo, suaves colinas onde preponderam gramíneas. Um mar de cerros verdejantes
é o que tenho diante de mim. Adentramos, finalmente, na famosa yunga, que vêm a
ser bosques nebulares característicos das montanhas andinas. Tão úmido este ambiente que
pedras, troncos e galhos de árvores estão fartamente cobertos por musgos. Paralelo à trilha, escuto vindo do estreito
córrego, pontilhado de minicascatinhas, o incessante e agradável rumorejar da
correnteza batendo nas pedras. Nada fácil caminhar nesta trilha aberta em meio
à cerrada vegetação, o que me traz à lembrança nossa mata atlântica. A maioria
das pessoas temem subidas, eu, entretanto, me cago nas baixadas. Esta, além de
íngreme, tá cheia de pedras soltas. Como tem chovido muito, graças ao El Niño,
o terreno em diversos trechos revela-se bem enlameado. Entre um bosque e outro,
zonas descampadas onde domina descolorido capinzal. Aproveitamos pra comer algo
quando chegamos ao posto de Calixta, abandonado após sua morte. Numa das
janelas, o costume regional de desenhar a giz uma cruz rodeada por corações indica o recente
falecimento da proprietária. Dramática mudança de
tempo a partir do posto de Calixta. O céu nubla repentinamente e a neblina toma
conta da atmosfera. Sucede-se a uma curta e áspera subida nova descida que
desemboca numa clareira. Aqui acontece o imbróglio onde Fernando se perde e não
encontra a continuidade da trilha. Começa então uma sucessão de entra-e-sai no
que ele supõe seja a trilha principal. Triste engano: revelam-se apenas picadas abertas pelo gado, super fechadas, porque pouco
transitadas, maior
chatice percorrê-las, galhos barram o caminho e
espinhos se agarram à roupa. Nada paciente, começo a me irritar com aquela
galharia infernal e não vejo a hora de terminar a pernada. Após uma hora perdidos
saltando dum filo a outro filo, como fala Fernando, acertamos o rumo e
engrenamos lomba abaixo, avistando, finalmente, San Lorenzo e mais adiante
Salta....ebaaa! Devido a outra desorientação de Fernando damos não em San Lorenzo,
conforme o programado, e, sim, em Las Costas, um de seus distritos. Tadinho de Fernando, mais uma vez, se perde, nos fazendo descer por uma piramba do outeiro de La Cruz
Blanca. Eu, pensando que a aventura terminara, percebo, louca de medo, que posso num vacilo despencar e quebrar o pescoço. Enfim, às 17 horas, após 14 km de pernada, alcançamos a estrada onde Pancha nos resgata. Hospitaleira, a mulher de Fernando, trouxe café (graças a
deus não adoçado) e um delicioso pão feito em casa, receita de família. Estou
super cansada razão por que recuso o amável convite de meu guia pra comermos
empanadas regadas a cerveja preta numa bodega de San Lorenzo. Dou minha missão
por cumprida e o que quero é singelo: um banho quente e caminha assistindo
televisão, hehehe!





Um comentário:
A parte de 'perdidos no bosque' foi a melhor! ahahah... A sua narrativa é a melhor parte dos vídeos! E olha que as paisagens são estonteantes, viu, Bea! Bjs! Alu
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