sexta-feira, 7 de abril de 2023

Retorno à Chapada das Mesas

Conheci a Chapada das Mesas, no sul do Maranhão, em 2018. Como gostei muito do lugar, e morando agora colada nesse estado nordestino, é pra lá que vou curtir o feriado de Páscoa, até porque quero conhecer a região na época da chuva. Já ciente de que as Serras Gerais começam no Maranhão, posso observar com gosto as diferenças entre as do Tocantins e as
serras maranhenses. Considerando a mesma formação sedimentar das rochas e a constante erosão por elas sofridas, aqui, contudo, inexiste formação de dunas nas encostas das serras, embora os rios escavem pequenos canyons encantadores, destacando-se os do Santuário, Poço Azul e Recanto Azul, os mais badalados. Substituindo os paredões compactos da serra tocantinense, surgem, nas serras do Maranhão, mesetas, pequenas serranias e morros testemunhos aqui e acolá, destacando-se o Morro do Chapéu – cartão postal da Chapada das Mesas - vislumbrado durante a travessia no rio Tocantins na balsa que liga Filadélfia e Carolina. Assim que chego, na quarta-feira, aviso Marcelo, que conhecera no Vale dos Pássaros, e combinamos alguns rolês juntos. Dia seguinte, quinta-feira Santa, o roteiro é conhecer o Poço Azul - que eu visitara quando aqui estive a primeira vez – e o desconhecido Recanto Azul. E lá vamos nós, Marcelo mais eu, pro Riachão onde os atrativos se localizam.
Dos 139 km do trajeto, 106 são asfalto, o restante chão batido que, nesta época de chuvaral, costuma dar certo trabalho pra carros que não sejam traçados. O primeiro a ser visitado é o Recanto Azul, distante 7 km do Poço Azul, e não me desaponto: o pequeno canyon, cercado por paredões ora levemente avermelhados, ora cobertos de musgos e vegetação, comporta em seu fundão a nascente de um rio de água azulada e temperatura tépida onde centenas de peixinhos nadam indiferentes à nossa presença. Quando começa a chegar um bando de gente, eu e Marcelito nos mandamos. O encanto do lugar se quebrou! Sei que sou chata, até me considero meio misantropa, mas gritaria e criaturas fazendo caras e bocas ao tirar fotos e fazer vídeos me deixa beeiim arreliada. Vamos então ao Poço Azul e como falta justo uma hora pra fechar, conseguimos pagar ½ entrada.....ebaaa!! Visitamos, inicialmente, a cachoeira Santa Bárbara, queda d’água de 76 m, que está bombando de tão cheia, graças às chuvas de março que, aqui, não fecham o verão e, sim, o inverno. A cachu fica no final do canyon, um brete escuro e úmido, cercado de mata atlântica. O tempo restante dá apenas pra ir ao poço Azul, embora haja mais 6 cachoeiras no local. O poço não está límpido como quando cá estive à época da seca, mesmo assim dá pra perceber sua coloração turquesa. Marcelo muito acrobático, dá saltos mortais de costas na água enquanto eu filmo o moleque de 45 aninhos. E os fiscais nos tocam pra fora porque já são 17 horas, horário de encerramento dos atrativos naturais. A gente então vai à cata de algo pra comer porque bem desavisados não leváramos lanche, somente algumas bolachas. O complexo turístico além dos atrativos naturais conta com uma baita infra: além do hotel, restaurantes, lanchonetes, bar, piscinas e quiosques com confortáveis sofás pra descansar as pernas do sobe e desce das trilhas ou relaxar após o almoço. Como tudo é caro, desistimos de beliscar algo ali, pegamos a estrada e comemos uns engasga-gatos numa lanchonete perto de Riachão. À noite, sim, a comilança vale a pena: os deliciosos crepes da Tribo dos Crepes, cuja massa fininha lembra hóstia, e o recheio farto passa longe de ser um crepe de vento! Deixo meu companheiro de aventuras em seu hostal, no centro da cidade, e me vou BR 10 afora, conhecida como rodovia Transamazônica, até o Refúgio do Raiz Camping, de Renilton, distante 15 km de Carolina. Além de local pra acampar com cozinha comunitária equipadíssima (3 geladeiras, fogão, micro e utensílios diversos), Renilton construiu pequenos bangalôs com banheiro. É num deles que me instalo. Só acampo, atualmente, se não tenho outra opção, porque minha coluna corroída que está de artrose pede certo conforto. Afinal, aos 70 anos, eu mereço certas regalias, não é mesmo? 

Na sexta-feira Santa, esperamos Marcelo vir de Carolina pra fazer a trilha do Bananal aberta por Renilton um par de anos atrás. O início da trilha começa no camping, quase colado à BR. Atravessamos a rodovia e pegamos uma estradinha de areia fofa e clara cercada de gramíneas altas, tipo cola de raposa, e árvores de pequeno porte com troncos revestidos por aquela casca grossa que, ao tato, é similar à cortiça, tão peculiar da vegetação do cerrado. Pouca demora avistam-se os paredões avermelhados de um morro por onde subimos. O ascenso é duro porque a encosta é íngreme. Renilton vai na frente desbastando com seu facão o mato ao redor. E mostra, na passagem, a planta cujo caule fino provoca queimaduras na pele ao se roçar nela. E dale o bom guia a disparar faconaços aqui e acolá pra desatravancar o caminho da vegetação daninha. Passamos por um trecho com várias reentrâncias, abertas na parede da rocha, tipo covas. Diante delas pipocam alguns solitários cactos mandacarus, ainda sem floração, característicos dos chapadões que brotam na região. E conforme ganhamos altura, a paisagem revela vários morros, dentre eles as 7 Marias. E solitárias plantas carnívoras, do tipo drosera tentaculata, quase passam despercebidas tão grudadas estão no chão arenoso. E presencio o "assassinato" dum inseto tentando fugir de seus “tentáculos” mas infelizmente a gosma secretada pela planta é uma armadilha mortal. E novamente estamos costeando outro paredão de rocha coberto de vegetação. O ambiente fresco, livre de sol, é perfeito pra caminhar. Chegamos ao bananal, origem do nome da trilha, um verdadeiro labirinto, bom pra se perder. Mas nós não corremos este risco porque temos o nosso guia conosco...aleluia!! Renilton conta que o bananal foi plantado pelos moradores das cercanias, dando direito, a qualquer um que consiga carregar os pesados cachos de banana, a levá-los, seja pra consumo próprio seja pra venda. E andamos um bom pedaço dentro daquele dédalo de bananeiras até sairmos por completo do frescor proporcionado por elas. Chegamos no segundo mirante da pernada donde se vê o rio Tocantins, divisor natural entre Maranhão e Tocantins. Até hoje não foi construída ponte pra travessia do rio, motivo por que ainda se usa balsa pra ir dum estado ao outro. Do alto do mirante, se avista nitidamente a BR 10 com veículos trafegando em sua única pista, e o morro do Chapéu do outro lado da rodovia, bem diante da gente. Ao lado, algumas das 7 Marias. Segue-se à pernada no terreno suave do bananal, uma subida punk, no meio duma mata fechada, com direito ao auxílio dum corrimão feito de corda, providencialmente instalado ali por Renilton. Foi uma mão na roda o improvisado balaústre....se foi! Embora a subida tenha findado, o frescor do bosque já era, porque ingressamos numa zona com vegetação esparsa que não filtra nadica de nada a passagem dos raios solares. E já são mais de ½ dia, então já viu, né? A canícula tá castigando nossos corpitchos. Dois cachorros nos acompanham, a Belisca e o Cadu. Lá pelas tantas Cadu se embrenha no mato e desaparece por um bom tempo. E nós dale a chamá-lo mas ele nem aí. Renilton comenta que ele deve ter achado rastro de bicho no mato, motivo porque não aparece. Chegamos na Pedra Furada ou Portal da Chapada das Mesas, outro cartão postal da região. Dali temos uma visão privilegiada da paisagem onde morros e chapadas se entremeiam naquele colorido tão característico das rochas sedimentares fervilhantes de óxido de ferro, conferindo aquela tonalidade avermelhada às pedras. O contraste com o verde da vegetação é impactante. E lá estão os Pilares da Chapada, um de cada lado da BR 10, no papel, eu diria, de protetores desse pedaço das Serras Gerais. E Renilton vai nomeando as elevações, indicando aquela como a serra da Maroquinha, mais adiante o morro do Jacurutu e a serra da Cangalha, sem esquecer o morro do Picos que, embora pequeno, sobressai na paisagem pelo seu perfeito formato piramidal. Começamos a descida pra pegarmos o breve trecho de trilha até o camping onde chegamos lá pelas 13:30 horas, disparando cada um em seu carro até Carolina pra ver se encontrávamos restaurante aberto, porque - detalhe - eles só ficam abertos até 14 horas, reabrindo à tardinha. Graças ao Marcelo vamos parar no restaurante da Catia que, graças a deus, tem uma comidinha pra gente....há que se tratar bem a pancinha, não é mesmo?


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