quarta-feira, 5 de março de 2014

Bafafá na fronteira

Deixo Villa Serrana com gostinho de quero mais. E nova improvisação acontece em nosso roteiro original de pedalada! Ed explica que se formos até a Quebrada de los Cuervos não dará tempo pra fazer as tais compra no free shop de Rio Branco. Propõe então uma segunda opção: manter as compras e pedalar, trocando, porém, a Quebrada pelo lago Merín (lagoa Mirim pra nosotros) cuja distância aproximada, ida e volta, dá 40 km. Claro está que vencem as forças de Mr. Hyde. Nem todos os cavalheiros de Jedi conseguiriam vencer a sanha consumista da maioria do grupo. Deus que me perdoe por não controlar a danada da minha língua mas esse pedal tá parecendo excursão de muambeiros do Paraguai (só de raiva escrevo com “i”, eles não merecem o escultural “ipsilone”). Quando chegamos a Rio Branco, cidade uruguaia separada da brasileira Jaguarão pelo rio de mesmo nome, eu que nunca viera aqui não lamento nem um pouco. Feia, sem quaisquer atrativos, salvo pela ponte internacional Barão de Mauá, construída no início do século passado, Rio Branco não apetece ficar nem um par de horas. Mesmo os free shops são fraquinhos se comparados aos de Rivera, onde o comércio dá de 10 a zero. Pela última vez, monto o pneu dianteiro - putamerda, se é a última vez, já que quando chegar em Porto, vou ter de montar a bici pra ir pedalando pra casa – , ou melhor, quem monta é Victor. E verificamos que o pneu traseiro está furado. Retiro da nécessaire, fixada abaixo do selim, câmara reserva e – merda – verificamos que a válvula é inadequada bem como as das outras duas câmaras que tenho na mala - pra meu desgosto - porque são válvulas grossas, inadequadas pros meus pneus, que exigem a francesa, de bico fino. Victor então começa a fuçar procurando o furo na câmara. Se houve demora, não foi por culpa do querido rapaz e sim porque meu kit estava com validade vencida. Eu o tinha há 3 anos e nunca o usara desde que o comprara. Após pedir pra um e outro, conseguimos cola e adesivo em bom estado de uso. Como o pequeno grupo que ia pedalar (a maioria prefere ir às compras: seja porque estão satisfeitos com os km percorridos, seja porque já sentem os joelhos doídos, seja porque - galos cinzas fodásticos que são - esnobam pedalar em estrada plana e asfaltada, sem qualquer grau de dificuldade técnica) já tinha largado fazia quase uma hora, Ed pôs minha bici e a de Victor no suporte traseiro da caminhonete e nos deixa a uns 5 km do balneário, motivo pelo qual meu percurso ida e volta deu 28 km (http://connect.garmin.com/activity/456000994) enquanto o deles alcançou a boa marca de 48 km! Quando vejo aquela imensidão de água - mais parece um mar, nem se distinguindo a outra margem - tiro os tênis e entro na lagoa. Todo mundo se esbalda, mergulhando em suas mansas águas. Na lanchonete em frente à praia, peço um chivito de carne de porco, delicioso de bom. E a volta é osso porque sopra um ventinho contra que castiga esta senhorinha. A velocidade que, na ida, atingiu fácil a média de 25 km/h, não sobe de 16 km/h. As carretas que passam provocam um forte e até – pode-se dizer com algum exagero – perigoso deslocamento de ar. A rodovia sem acostamento exige bastante cuidado, vá que algum projeto de psicopata queira tirar fininho só pra implicar com a gente, né? E há os que fazem isso só de sacanagem, os filhos da puta! Terminado o pedal, dá tempo pra ir numa das tantas lojas e comprar algumas latas de patê mais dois vidros de azeitonas recheadas com chilli. Não resisto e acabo levando mais 3 garrafinhas de  pomelo. Já dentro do veículo, preparados pra cruzar a fronteira, aqueles que retornam pras suas casas de avião, questionam Ed sobre o local onde ficarão quando chegarem em Porto Alegre. Ed pondera que é complicado largar cada um em seu hotel, concluindo que será, portanto, no aeroporto onde podem pegar táxis que os conduzam aos locais onde se hospedarão. Ele se despede pois não retornará conosco, permanecendo, contudo, os guias Vicente e Gabri como responsáveis. O pessoal comenta entre si que prefere ficar na frente do hotel “x” ao aeroporto, tendo em vista que os hotéis reservados localizam-se um ao lado do outro. Baixa então numa "simpática" moça "aquele espírito de síndica, zelando pela ordem e bons costumes". Ela chama o xerife -  Ed é claro - e faz “queixa” - isso mesmo que vocês estão lendo - "queixa" do pessoal!! Que eles estão se “amotinando” (sic). Que sem ele -  Ed - no busão será complicado lidar com a situação, pode? Denise, uma das queridas que pernoitará em Porto, não deixa barato. Aproveita que Ed ainda se encontra à porta do ônibus e, sem alterar a voz, bem classuda, explica que ninguém está se amotinando. Ed escapole de fininho, deixando o abacaxi pros outros guias descascarem. Ao ver como a galera fora tratada, tais quais perigosos delinquentes, cujo tratamento deve ser a ferro e fogo, não resisto. Levanto do assento, viro pra Denise e, em tom irônico, comento em voz audível: "Amotinada hein?!" Bah, a guria monta num porco. E estoura. Com olhar fulminante – se fosse raio eu não estaria aqui contando a estória - indaga o que tenho contra ela. Percebendo o descontrole emocional da criatura, deixo quieto, e sorrio vez por outra. Fazer o quê, né? Vá que a doidinha parta pras vias de fato, uai. Fatima, ao meu lado, chega a se encolher, sei lá se de medo que sobre pra ela, caso a mulher resolva mesmo partir pra ignorância, ou se de constrangimento pela tormentosa situação. Cada vez que lembro da carinha assustada da Monster, tenho frouxos de riso. No final, aleluia, o bom senso dos guias prevalece e o pessoal é deixado na frente dum dos hotéis. Fatima, eu e Greice, a quem convidara pra dormir aqui em casa, entramos madrugada adentro, no terraço, bebericando um vinhote branco bem gelado. E brindamos então à vida, à indiada do pedal e a nossa recém iniciada amizade, rindo e falando bobagens na quente noite portoalegrense!  

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