sexta-feira, 29 de março de 2013

Presente de Páscoa: Rolê na Mantiqueira

Percebo que estou próxima a Passa4 quando começo a visualizar, da rodovia dos Bandeirantes, o complexo de serranias que formam a Serra Fina, onde reina altaneira, com seus 2.798 m, a Pedra da Mina, considerada um dos 10 picos mais altos do país. Foi barbadinha subi-la. Fi-lo há 2 anos atrás, com a mesma agência, Montañero Expedições (https://www.facebook.com/Montaneroexpedicoes), que irá me guiar agora na travessia Marins-Itaguaré. Mais uma vez eu na Mantiqueira....ebaaa!!!Com 500 km de extensão, esta serra que nasce em terras paulistas, dá um breve rolê por solo fluminense e aquieta os costados em Minas, onde está fincada a maior parte de seu território.Pesquisando no google, fiquei sabendo o seu significado em tupi-guarani: gota de chuva....vejam só! Com dezenas de picos cuja altitude ultrapassa facilmente os 2.000 m, a Mantiqueira exibe 3 serranias famosas no sentido oeste-leste. A primeira abriga os picos do Marins, Marinzinho, Pedra Redonda, Itaguaré e Pico do Cristal que finda na garganta do Embau, seu ponto mais baixo. Segue-se, a serra da Gomeira com os picos Gomeirinha, Gomeira, Figueira, Jacu e Violero cujo ponto final é a Toca do Lobo, onde tem início a serra Fina. Esta serrania compreende os picos do Capim Amarelo, Pedra da Mina, Cupim de Boi, Cabeça de Touro, 3 Estados e Alto dos Ivos,  separados  do  complexo  de Itatiaia  pela garganta  do Registro. A descrição de tais acidentes topográficos me foi contada por Davi, “nego veio” do mato, descendente, não comprovado, de Fernão Dias Paes Leme. Aqui nesta região, imprecisas são as fronteiras. Uma hora você tá em Minas outra em São Paulo acolá no Rio. Chego à tardinha em Passa4 após quase um dia viajando. Um avião me leva de Porto a Guarulhos, de onde pego um busão a São José dos Campos, esperando nessa cidade um par de horas até que outro busão me conduza finalmente a Passa4. Muito bom reencontrar Rodolfo, Zangão Dourado da Mantiqueira, Willian Peres, Príncipe da Mantiqueira e Josiane, namorada deste último. Beberico na cozinha do Harpia Hostal, uma construção datada do século XIX, uma cachacinha de estalar a língua tão saborosa é. E no velho fogão a lenha, borbulha sobre a trempe um café novinho que Rodolfo acabara de passar. Mal conheço meus companheiros porque sou arrastada por uma maluca pra jantar com ela. Quer porque quer comer feijão com arroz. Consigo a caro custo desviá-la pra provar as deliciosas empadas do La Motta. Feitas na hora por Mauro, são uma delícia.  De pancinha forrada, então, vou com  a maluquete  (até esqueci o nome dela) comer o tal feijão com arroz. Pergunto se ela está há muito tempo sem comê-lo. Apenas um dia. Cada uma! Essa mulher me exaure tanto com seu conversê que, em chegando ao casarão, vou direto pro quarto. A bem da verdade, confesso que estava mais exausta das viagens que do papo monopolizante da criatura. Bueno, dia seguinte, quando chego na cozinha, lá estão, dentre as quais a querida da noite anterior, algumas das pessoas que vão fazer a travessia Serra Negra-Maromba, tomando café. E que café!! Pão de queijo quentinho, pão francês crocante, fatias de pão de sanduíche, distribuídos em cestas de palha, dispostas sobre o fogão a lenha. Na comprida mesa retangular, manteiga, requeijão, queijo branco e amarelo, mel, frutas. Enfim, um repasto de respeito, substancial o   suficiente  pra   fazer   frente  ao  primeiro  dia   de  pernada  que  promete  ser  dureza. Embarcamos na boa e velha Kombi trafegando primeiramente por uma rodovia. Cruzamos a fronteira Minas-São Paulo. Decorridos alguns quilômetros, saímos do asfalto e nos internamos numa estradinha de chão batido. Tão enlameada está em alguns trechos que lá pelas tantas somos obrigados a descer do carro e empurrá-lo porque atolou no barral. Após uma hora sacolejando dentro da Kombi, chegamos no ponto donde inicia a pernada. Dá pra ver nitidamente o contorno do Marinzinho já que o tempo tá legal. Uma breve caminhada até o acampamento-base do Marins, cujo dono, o Milton, tá de saída pra comprar cerveja em Cruzeiro. “Heineken, só dessa cerveja vendo aqui”, frisa ele. Aproveito pra conhecer melhor os meus companheiros de viagem que são em número de 5, todos homens. Alex, carioca e ciclista, graças a deus, não parece ser aquele tipo de carioca da gema que, de tão bairrista, reivindica serem as tragédias de seu estado as piores do país, quiçá do planeta. Que ego os cariocas têm!! Zé e Ivan são paulistas. O primeiro, tão coroa quanto eu, trata de usufruir sua bem merecida aposentadoria. E o segundo, quietinho, trabalha no ramo da Informática. De guias, Willian, meu velho conhecido, e Natanael, encarregado de carregar minhas tralhas e mais um pouco. Tanto que esse pouco faz com que sua mochila esteja pesando bem uns 35 kg!! Mas a cereja da galera é nada mais nada menos que um vira-lata todo esquisito, magrinho como seu dono, Natan, com um defeito na pata e uns calombos espalhados pelo corpo mirrado, de nome Johnny. Que guaipeca!! Feliz de estar na trilha, ele corre na frente do grupo e se posta como uma sentinela em cima duma pedra sinalizando o caminho. Quando menos se espera, passa bem doido por entre nossas pernas pra se juntar a seu dono que encerra a fila. Como temos hoje de vencer um desnível de aproximadamente 1.000 m, o trajeto é, óbvio, mais subida que descida. Chegamos ao Morro do Careca onde mal dá pra se avistar o visu do vale do Paraíba. Uma mal intencionada cerração tal qual perversa cortina tapa uma boa parte da paisagem. Puta que os pariu!! Tempo ruim...será? Quando paramos pro almoço, não resisto e trato de apelidar Zé. Como ele  veste garbosamente um chapéu com uma pena, passa a ser Zé da Pena. Enquanto estamos sentados na laje, comendo nossos sandus, o maledeto nevoeiro, como num passe de mágica, se evanesce, permitindo que apreciemos o paredão do Marins contornado por um céu azul...aleluia!! Largo a comida e trato de pegar minha máquina. Sabe-se lá se terei outra oportunidade de fotografar a montanha! Guardada a matalotagem, recomeçamos a caminhada. Lá pelas tantas um paredão rochoso duns 4 m desafia os caminhantes. Escalaminhamos na boa. Zé nos surpreende com sua agilidade, considerando que é seu debut em trek selvagem. Até então só fizera trilhas sem qualquer tipo de perrengue, salvo o da extensa quilometragem, tipo Santiago de Compostela, Caminho da Fé e outras do mesmo gênero. Somente Johnny tem de ser guindado. Essa parada o valente cãozinho não consegue superar. E olha que ele é sangue nos “zóio”, o maroto, hehehe!! O tempo segue estranho. Ora céu nublado, ora céu despejado! Próximos ao local onde acamparemos, um paredão com uma aclividade mais acentuada exige certa atenção. Subo a encosta sem precisar de ajuda porque a aderência do granito é excelente. Gosto de tentar por mim mesma. Só peço ajuda excepcionalmente. Seja quando não consigo dar uma passada devido às minhas pernocas curtas – meço um metro e meio! – seja quando me deparo com um obstáculo que me deixa muito tensa por causa da altura. Em torno das 17 horas, chegamos ao acampamento, situado a uns 200 metros do cume do Marins, perfeitamente visível, porque,   coisa  boa,  o  nevoeiro   foi  dar  uma  banda  em  outras  paragens. Mais a leste, avultam as pontiagudas pedras do cume do Marinzinho. Muitas nuvens pairam sobre o vale. Um grupo, com quem cruzamos, subindo o paredão, monta barracas próximas às nossas. Will saca da mochila o precioso líquido fabricado nos alambiques mineiros. Todos dão valentes talagaços pra recompor as energias gastas na caminhada. Embora tenham sido apenas 6 km, a pernada vale por 20 km em razão das dificuldades técnicas e dos muitos trepa-pedras enfrentados. Vou pra minha barraca descansar um pouco e constato que novamente o tempo se emburrou. Tudo o que vejo é um céu cinza e uma garoa assanhada umedecendo o ambiente! E a friaca começa a reinar. Antes da janta, trato de fazer uma social e vou até a barraca de nossos vizinhos. É uma garotada de Ribeirão Preto bem simpática. Estão em dúvida se sobem o cume do Marins. Decidirão amanhã. Oferecem-me cachaça. Eita bebidinha boa. Não dá pra recusar, né? Janto na barraca dos guias e lá fico batendo papinho com eles. Will fica chateado porque sua massa passou do ponto. Consolo-o dizendo que sua galinha tá bem temperada. Quando retorno pra minha barraca, constato que o tempo continua uma merda!! Será que vai ser assim durante os dois dias restantes de pernada....será, meu bom São Pedro?!!

Um comentário:

Miriam Chaudon disse...

Esse café da manhã......eu quero também!