sexta-feira, 14 de junho de 2019

Abraçasso no Brasil 2019: Explorando melhor Goiás

Na sexta, 14 de junho, com a Chapada dos Guimarães se distanciando no horizonte, o plano é dormir em Barra do Garças onde fiquei ano passado. Ao ali chegarmos, enquanto abasteço o carro, por sugestão dum frentista, seguimos pra Aragarças, já em solo goiano, procurando o balneário Água Santa por ele indicado. À beira do mítico Araguaia, o lugar conta com excelente estrutura de camping, restaurante e piscinas de águas termais. Como pano de fundo, a serra do Roncador que se estende por 800 km do Mato Grosso ao Pará. Baita dica a do rapaz, valeu, meu bruxo! Permanecemos até domingo de manhã, lastimando partir de tão agradável lugar. Contudo aproveitamos bem o sábado, pedalando por estradinhas de chão batido de manhã e navegando de voadeira no Araguaia à tarde. Durante o passeio, vejo dezenas de aves, destacando-se as lindas garças de plumagem rosada, mergulhões e os fugazes botos cinza que mal dão pinta fora d’água. Super piscoso, o Araguaia é delírio da galera que gosta de pescaria, motivo por que se vêem, em plataformas projetadas sobre suas águas escuras, turistas empunhando sofisticadas varas de pescar. Enquanto rumamos pra Brasília, me dá na telha conhecer Pirenópolis motivo por que desvio então de rota. Pedro Emílio fica muito contente porque lá morara há 30 anos. O lindo e preservado centro histórico exibe antigos casarios pintados em cores vivas. Pernoitamos no Jardim Secreto, cujo dono, Diogo, pertence também à tribo dos alternativos (diferente porém da do Xamã já que a sua é a de 1 homem só). Praticante de Daime, abandonou emprego público em Goiânia, se estabelecendo aqui onde toca sua pousada e camping. Dormimos em redes penduradas no quintal, contudo nosso objetivo é acampar em local não tão urbano, por isso nos mandamos pro camping Raízes, lugar adorável à beira do rio das Almas, no meio do mato, onde penduramos as redes. O dono, Fernando, super amável, deixa até lenha armada pra fogueira noturna. Foi tanto o frio nas duas noites em que lá pernoitamos que, na segunda, enchemos garrafas plásticas de 500 ml com água quente de modo a aquecer os pés. Em compensação, a lua cheia abrilhantava a escuridão cada vez que eu levantava, tiritando, na madrugada pra urinar! No último dia em Pirenópolis, contrato Carmem Cecília, tatuadora que vive na pousada de Diogo, pra nos servir de guia. Ela nos leva a lugares onde não é cobrada taxa de visitação. Assim conhecemos uma parte da cidade de Pedra e as belas cachus das Andorinhas e Sonrisal, sendo que nesta última sucessivas quedas d’água terminam em poços de esverdeada limpidez. A caminho da segunda cachoeira, paramos no mirante do Ventilador donde se avistam Pirenópolis e a chaga representada pela pedreira escavada na encosta da serra dos Pirineus que rodeia a cidade. O passeio termina com a subida ao ponto mais alto da região, o pico dos Pirineus. Nem só às atividades físicas dedico minha estadia em Pirenópolis. Há também momento cultural quando descubro no museu do Divino, a sen-sa-cio-nal exposição de esculturas de terracota feitas pela nonagenária artista plástica Safia que trabalha com o barro desde 0s 7 anos de idade. Na quarta, agora sim, a caminho de Brasília, passamos por Salto do Corumbá, lindíssima queda d’água à beira da BR 414. Etanol baratíssimo desde Mato Grosso do Sul, uma beleza. Em MT chega a 2,60. Na capital federal, ficamos no quitinete emprestado por minha amável prima Maria Luiza, pertinho do ape de Jorge Otavio e Sonia, outros primos queridos com quem na última noite nos divertimos muito jogando cartas os quatro na casa do casal. Conheço outra faceta de Brasília, invadida por frente fria que traz além de queda de temperatura rajadas fortes de vento....que merda! Durante os 5 dias na cidade, não descuramos de nossa rotina de exercícios físicos, pedalando todos os dias nas suas boas ciclovias. E a parte cultural foi preenchida por audições de MPB, em especial chorinho e forró, proporcionados por Clarissa, outra prima, que canta e encanta em vários bares da cidade. Era pra gente ter partido de Brasília no domingo mas como Pedro Emílio foi atropelado, ou melhor, atropelou de bicicleta um carro no sábado à tarde (a consequência foi que acabou no hospital de Base pra dar pontos na cabeça porque estava sem capacete, o tonto), somos obrigados a estender nossa estadia por mais um dia. Isso porque nosso próximo destino, Vila São Jorge, é carente de recursos hospitalares, e vá que nesse meio tempo tenha o Xamã alguma convulsão. Por precaução, partimos na segunda-feira, quando a caminho da Chapada dos Veadeiros, paro na Vovó Herminia prum lanche-almoço. O estabelecimento, especializada em quitutes goianos, tem como carros-chefes suco de milho, empadão goiano e pamonhas com diversos recheios. Ao chegar à Vila vou direto e reto pro Canto da Coruja sendo recebida pelo incansável Buba, pau pra toda obra no sítio. O camping sofreu melhorias significativas, passando a ter um setor de glamping, cozinha aberta com fogão caipira e centro de meditação na colina distante 200 metros da sede. Também ali se encontra Carlos, simpático catalão de Barcelona, permutando trabalho por hospedagem e comida. Veio pro festival de slack line já realizado em Cavalcante. Descubro a exótica cachaça de jambu, comprando além duma garrafa desta bebida, outra de arnica. Nos deliciosos 5 dias que ficamos na vila, muito pedal pelas redondezas, pernada ao mirante das Estrelas onde curto baita pôr de sol e 2 trilhas no PN Chapada dos Veadeiros: a do Carrossel, Saltos e Corredeiras, num dia e a dos Canyons e Cariocas, noutro. Almoços na Nenzinha, bufê de saborosíssima comida caseira. Na sexta, pé no acelerador: próximo destino, Terra Ronca que não consegui conhecer ano passado, mas neste, sim...uhuuu!!! Situado no nordeste de Goiás, o Parque Estadual de Terra Ronca abriga mais de 200 cavernas secas e 60 molhadas, sendo considerado um dos maiores complexos de cavernas na América do Sul. O local abriga 7 das 30 maiores cavernas do Brasil. Aliás, seu nome vem do som dos rios dentro das cavernas que ao reverberar pelas paredes lembra roncos. A maioria delas destina-se apenas a pesquisadores; ao turismo estão reservadas 17, sendo 11 delas grandes complexos de diferentes níveis de dificuldade. Quem parte de Brasília, têm 2 rotas pra visitar o parque. A primeira é pegar a BR 20 até Posse e depois seguir pela GO 108 até Guarani de Goiás. Já que estou em Alto Paraíso, escolho continuar pela GO 118, seguindo pela GO 112 que exibe ásperas formações rochosas em parte de seu trajeto. Após sua relativamente boa estrada de chão batido, enfrenta-se o poeirento e avermelhado terreno da GO 447, um martírio. Almoço em Vazante, distrito de Divinópolis, cuja comida caseira feita pelo dono (a mulher teve de sair) é de lamber os beiços! Xamã se serve 3 vezes! Atravessamos Divinópolis e logo estamos na pacata São Domingos onde dormimos. A simpática cidadezinha, localizada à beira do lago São Domingos, pede um pedal, é claro!! Assim, pedalo pelos arredores, curtindo a bela paisagem das rochas de coloração avermelhada que formam a serra Geral cujo destaque é o pontudo morro do Moleque. No sábado, enfrentamos os 41 km da GO 110, estrada de chão batido bem ruinzinha até a vila São João Evangelista. Trata-se duma pequena comunidade com algumas centenas de moradores. A rua principal, sem calçamento, é onde a maior parte da vila se assenta. Sua localização é estratégica, considerando que as cavernas as quais são permitidas visitação se situam mais próximas desta vila do que de Guarani. São Vicente situada a 10 km da vila não está aberta à visitação pois necessita de rapel pra atingir seu interior e no momento não há guia que faça tal atividade. Angelica, a 25 km, também antes da vila, ao passo que Terra Ronca I e II, São Mateus e São Bernardo distam, respectivamente 13 km e 23 km depois da vila. O guia contratado, João Pedro, é um simpático e paciente rapaz de 22 anos. Seus pais, Laureci e Rubem, donos do camping onde estamos, são muito amáveis. Ela me presenteia com ovos de suas galinhas e oferece café adoçado quando, sentada à varanda de sua casa, aproveito o wifi inexistente no camping. Hoje vamos a São Mateus. Poucos são os dias nublados no centro-oeste, hoje, contudo, assim se encontra o céu, pouco importando já que vamos nos embrenhar nas estranhas da terra. Do interior do carro, vemos, além duma onça parda (pensei que fosse um cachorro rotweiler) cruzando a estradinha que dá acesso à caverna, duas seriemas que, assustadas, fogem campo adentro. Nada fácil percorrer a São Mateus. Temos de descer bastante até alcançar sua estreita boca, originada por sucessivos desabamentos, escondida por densa vegetação. Seu escorregadio e íngreme terreno calcáreo exige cuidado. A caverna cheia de altos e baixo, cortada pelas rasas e límpidas águas do rio São Mateus, conta com vários salões interligados por corredores, alguns bem estreitos. Os espeleotemas são interessantes: alguns lembram pela textura corais, outro um branco pássaro, num salão mais adiante, uma estalagmite representa com perfeição a Torre de Pisa! A bem da verdade, cavernas nem me atraem muito, exatamente pela ausência de luz em seus interiores, porém há vários anos, desde 2007, nutria curiosidade em conhecer a região. São 2 horas de intenso sobe e desce e quando saio da caverna respiro aliviada ao rever a luz do dia. Descubro que Xamã se sentiu oprimido, meio sufocado pela escuridão tanto que na volta deu um pique pra sair ligeirinho do breu, o coitado. Creio que foi o único passeio que ele não curtiu muito dos tantos que fizemos durante a trip. Se a manhã fora nublada, à noite o céu brilha coberto de estrelas. No domingo, vou só eu visitar as 2 Terra Ronca que em priscas eras foi uma só caverna. Com o desmoronamento de seu teto, restou dividida em duas, daí a denominação Terra Ronca I e Terra Ronca II. Quando estamos a 1 km da caverna, já é possível avistar a estrutura das rochas escuras que formam seu teto. Quando lá chego, deslumbro-me com sua gigantesca bocarra, que permite o vazamento de generosa porção de luz solar, de modo a permitir seja iluminado bom pedaço dos 800 metros de sua travessia. Me sinto literalmente uma formiga. Já de cara curto pra caramba a Terra Ronca I, exibindo, a alguns metros de sua entrada, rocha vazada no formato de coração, com o sugestivo nome de Pedra dos Namorados. O amplo e plano salão, cortado pelas claras e cálidas águas rio da Lapa, desemboca noutra abertura que sai na cerrada e verdejante mata conduzindo à segunda caverna. A trilha, linda, persegue o onipresente rio da Lapa que continua Terra Ronca II adentro. Recordou-me pelos perrengues das subidas e descidas os anos de canionismo em Praia Grande/SC. Desce-se até sua primeira entrada, pequena se comparada à I, para após 100 metros, alcançar a segunda boca. Neste segundo salão, igualmente plano, já na escuridão total da caverna, quebrada pela fraca iluminação de nossas humildes lanternas, atravessamos até a margem oposta do rio cuja correnteza, neste ponto fortinha, exige que nos agarremos em providencial corrimão feito com corda. A água por pouco não bate no meu queixo. Cumpre esclarecer: sou de estatura mignon. Avisto de longe um pequeno rasgo de luz que aumenta à medida que me aproximo da claraboia, assim chamado o desmoronamento na parede final da Terra Ronca II. Tal espetáculo só acontece de abril a julho quando os raios de sol vazam pelo buracão iluminando os espeleotemas que ornamentam suas paredes. Que ignorante sortuda eu que desconhecia tal detalhe! Terra Ronca me reconciliou com as cavernas....adorei ambas!! A caminho do mirante, no teto da caverna, escuto o trinar do periquito guerreiro, ave em extinção, cuja plumagem alaranjada colore seu peito e cabeça. Dali de cima, se tem uma ampla visão da Serra Geral que tanto admirara quando estivera em São Domingos há 2 dias atrás. Encerro o domingão, curtindo o visual super lindo da cachoeira das Palmeiras, situada a 8 km das Terra Ronca I e II. Realmente, Goiás e Santa Catarina são, em minha opinião, os mais belos e interessantes estados brasileiros! Infelizmente há que deixá-lo porque o destino final da viagem é Tocantins...simboralelê!!

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