Há
coisa dum mês recebo um telefonema com prefixo 85 e logo me questiono “donde do
Brasil, oxente?” Era Nara Alencar, direto
de Fortaleza, a quem conhecera faz 3 anos
durante um baita pedal em Urubici. Claro está que não ficamos todo esse tempo
sem nos ver, porque coisa dum ano depois, ela me convidou pra pedalar na
capital cearense e adjacências. Aceitei no ato e me toquei de mala, mas sem cuia! Dessa feita, a guria me convida pra passar um fim de semana de modo a
participar do pedal 4 Mulheres e um Destino. E agora, eis euzinha, esta
senhorinha de ½ idade que vos escreve, uma vez mais, retornando à terra de José
de Alencar. Serão por acaso tais sobrenomes? O de minha amiga e do grande escritor? Preciso indagar Nara sobre. Do
aeroporto,
após os festejos de praxe, sou levada pelas cearenses Narita e Alu Brandão prum restaurante de massas.
Intimamente, troco uma ideia com meus botões e faço aquela cara de desgosto que
expressa “comer massa? aqui, no Ceará?” Pois não é que tive de dar o braço a
torcer?! O restaurante Pasta e Pizzas tem em seu menu não só as tradicionais
massas, apelidadas de forno e especiais de fogão, como ainda as assim
denominadas massas de fogão, que vêm a ser aquelas com frutos do frutos do mar,
abundantes no litoral cearense. De lamber os beiços a comilança. Difícil resistir
e não pedir bis, tris e sair rolando tão boas as pastas são. Um arraso o
fettucini Maria Izabel, com carne de sol refogada com cebola, molho de tomate
e creme de leite. Além do ponto de cozimento perfeito, bem al dente, os
temperos e os ingredientes fazem a delícia de meu paladar. Além de mim, Nara (a idealizadora espiritual do pedal) e Alu (embora
debochada, é amiga leal, ciclista de ocasião e entusiasta das aventuras na
natureza), também se encontra à mesa Cristina Tavares (única conhecedora de
rudimentos básicos de mecânica de bici, a maranhense, dona dum humor peculiar, trata todo
mundo de colega). E pra coroar tão lauto jantar, aquele toquezinho sulista na refeição: espumante gaúcho, bem
geladinho pra brindar o tão aguardado pedal. De pancinha cheia, adormeço tal qual um anjo. Acordo na
sexta-
feira, passado um pouco das 5 da manhã, e vislumbro através da janela uma
baita claridade! Devido ao dia amanhecer cedo nesta parte do país, e também por
causa do calor, às 6 e 30, quando saímos de Fortaleza – não de bici ainda e sim
de carro - bastante gente já está correndo no calçadão à beira mar. Ivanara, irmão
de Nara cujo nome de batismo é Ianara, nos deixa em Lagoinha, distante
100 km da capital, donde o pedal iniciará. Esta praia, pouco explorada pela
turistada, exibe um visual lindo formado por dunas, coqueiros e falésias
avermelhadas, que se situam a 100 metros do mar, se tanto. Pequenos percalços
com as bicis de Nara e Cristina nos obrigam a parar. A da primeira, um freio reticente enquanto a
da segunda, o guidão foi montado ao contrário. E não é que a criatura
ainda pedalou uns 500 metros com a bici assim? Na primeira praia após Lagoinha, a
sossegado Guajiru, fazemos um bem vindo pit stop. Peço uma água de côco de modo a
hidratar o organismo pro que vem depois: a deliciosa cachacinha cearense. Nem
bem pedalados 7 km, nova parada em Flecheiras, no bar duma bela pousada,
em
frente à imensidão verde do mar. Amiúde, despontam, na faixa de areia, piscinas naturais resultantes da ação da maré alta. Peço uma dose de Ypioca
ao passo que as gurias vão de cerveja. Como sei que o povo de outros estados
adora quando os gaúchos falam à moda gaudéria, solto o famoso “baaah tche, barbaridade de boa essa Ypioca!” Elas adoram escutar eu falando "bah".... hahaha!! Embora não
seja de rajadas, o vento é constante. Sorte nossa que sopra numa direção
predominantemente SE-NO. Não à-toa, Narita, espertamente, bolou o percurso
rumo ao norte. Em diversos momentos não se faz necessário pedalar: o vento
se encarrega de empurrar a bici como se ela fosse um veleiro. Nas praias próximas às vilas de pescadores, coloridas velas de kite surf enfunadas
se erguem em rápidos vôos rentes ao mar. Céu de brigadeiro sem nuvem alguma embaçando o sol. A
lisura da praia só é interrompida por pequenas covas causadas pelo refluxo da maré. Várias barras
formadas por riachos em cujas margens formam-se degraus.
Contudo não de molde a obstaculizar a travessia das bicis. Ao longo da
costa que conduz a Mundaú, perpendiculares ao mar, parques eólicos, formados
por esguias torres e hélices metálicas de coloração branca, exibem design
estilizado de moinhos de vento dantanho. O odômetro registra 38 km pedalados
ao longo de 5 horas e 15 minutos quando em Mundaú freamos em definitivo as bicis. Aqui pernoitaremos, até domingo, na residência
das irmãs Alencar cujo privilegiado quintal fica diante do rio Mundaú! Esta praia, nos dias
que correm, já é bem conhecida no circuito litorâneo do estado. Encantador, o
balneário, além das elevadas dunas e das lagoas, exibe piscinas naturais à
beira mar. O pequeno vilarejo conta com vários mercadinhos bem sortidos. Num
deles descubro o sorvete Pardal, famosa fábrica de sorvete cearense, que
prestigia os sabores regionais de graviola, cajá, castanha e milho. Me atraco num de graviola, uma delícia! Ao longo da rua da Praia, uma deliciosa sonoridade amadeirada de tac tac tac se faz
ouvir. É o som produzido pelas rendeiras ao
manejar aos pares os bilros. O resultado do artesanato, herança portuguesa, zelosamente transmitida
de mães pras filhas, desde quando estas são meninas, é pendurado em
cabides, nas janelas das casas: vestidos, toalhas e blusas feitas de renda de
bilro ou birro. No almoço feito por Ivanara, macarronada com lagosta e porco a pururuca acompanhado por arroz. De bebida,
aceito a caipirinha de cajá preparada por Iva. As demais colegas mantêm-se firmes na cervejinha. Depois da
séstia, Iva faz deliciosas tapiocas recheadas com banana caramelada. Pouca
demora, saímos de casa pra aproveitar o que resta de pôr do sol. Na praça de
piso alajotado, construída justo no ponto de encontro das águas do Mundaú com as águas do Atlântico, ambas igualmente verdes, descortina-se do lado de lá do rio outra estação eólica,
plantada entre dunas. Já entardecendo, a paisagem adquire uma tonalidade
rosada, resultado dos últimos raios do sol poente. Tô no paraíso, oxente! Tenho ou não razão de estar prosa?





3 comentários:
Se eu não me engano tem Lagoa de Mundaú também em Alagoas! E que lindas fotografias....você é prosa em qualquer paisagem, minha amiga querida!
Parabéns a essas mulheres de garra e determinação. Pedalar é preciso , faz bem ao corpo e a alma !
Gostei do relato, Bea! Faltou apenas citar a minha pessoa nessa pedalada épica! hahaha...
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