sábado, 18 de junho de 2016

Enfim, las Yungas

Acordo às 5 da manhã com o galo cocoricando a milhão, tarefa que ele cumpre diligentemente até 8 horas quando então levanto e saio da barraca. Nem acredito no que vejo: após 2 dias de céu nublado eis o sol exibindo-se meio sem graça, mas não importa, tudo é melhor do que aquele ambiente cinzento que nos acompanhou durante 2 dias inteiros!! No desaiuno, liquidamos o resto do queijo que sobrara da janta. Os dois cachorros de Feliciana espertamente estão sempre enrodilhados diante do fogo de chão. Volta e meia ela ralha com Peluce, hilário! Aproveito que a fofa da velhinha está quietinha, mateando, pra puxar conversa. Queixa-se de que o dedo envolto em curativo dói. Indago, então, como conseguiu se machucar. Ela responde que rasgou o dedo num prego que prende a ferradura à pata do cavalo tentando sei lá se tirá-la ou se tentando raspar o casco do animal.....coitadinha! Partimos sem que eu consiga me despedir de Jose porque ele foi buscar mula e cavalo campo afora, descuidadamente deixados soltos ontem à noite. E sabemos, depois, quando o arriero telefona pra Fernando, que a demora foi bem mais duma hora até resgatar os 2 bichos! Feliciana nos leva até o final do páteo e, na despedida, lembra Fernando – pela décima vez, haja paciência - que não se esqueça de transmitir ao filho as encomendas que o guri deve lhe trazer quando vier visitá-la. Já afastados da casa, ouvimos sua vozinha fazendo as mesmas recomendações: "pilhas pro rádio, que o filho não esqueça de trazer". Um amor essa Feliciana! Às 9:30 já nos encontramos subindo o morro e à medida que ganhamos altura, aparece com nitidez a Quebrada Cuesta Grande e mais adiante a Quebrada Calderilla. A manhã, embora muito fria, está estupenda, céu claro e um charmoso colar de nuvens rodeia os cerros em frente. Paramos na Abra Sarapura onde há outra casa pertencente à Feliciana. Um lindo gato cinza e branco, super carinhoso, arqueia o lombo e se esfrega em mim, miando. Não deve estar mal de ratazanas nesta banda porque o bichano se mostra bem nutrido. O visual daqui de cima é estupendo, o mais bonito pra mim de todo o trekking. Dá pra visualizar o trajeto feito desde o 2º dia a partir da Abra de la Cruz e os cerros que se sucedem, alguns deles formando outro tanto de pequenas quebradas. Porque distantes os mananciais de água, não se acampa neste posto. O que é uma pena porque seria beleza pura acordar e dar de cara com tal cenário! Do posto Sarapura,  percorremos, não por muito tempo, suaves colinas onde preponderam gramíneas. Um mar de cerros verdejantes é o que tenho diante de mim. Adentramos, finalmente, na famosa yunga, que vêm a ser bosques nebulares característicos das montanhas andinas. Tão úmido este ambiente que pedras, troncos e galhos de árvores estão fartamente cobertos por musgos.  Paralelo à trilha, escuto vindo do estreito córrego, pontilhado de minicascatinhas, o incessante e agradável rumorejar da correnteza batendo nas pedras. Nada fácil caminhar nesta trilha aberta em meio à cerrada vegetação, o que me traz à lembrança nossa mata atlântica. A maioria das pessoas temem subidas, eu, entretanto, me cago nas baixadas. Esta, além de íngreme, tá cheia de pedras soltas. Como tem chovido muito, graças ao El Niño, o terreno em diversos trechos revela-se bem enlameado. Entre um bosque e outro, zonas descampadas onde domina descolorido capinzal. Aproveitamos pra comer algo quando chegamos ao posto de Calixta, abandonado após sua morte. Numa das janelas, o costume regional de desenhar a giz uma cruz rodeada por corações indica o recente falecimento da proprietária. Dramática mudança de tempo a partir do posto de Calixta. O céu nubla repentinamente e a neblina toma conta da atmosfera. Sucede-se a uma curta e áspera subida nova descida que desemboca numa clareira. Aqui acontece o imbróglio onde Fernando se perde e não encontra a continuidade da trilha. Começa então uma sucessão de entra-e-sai no que ele supõe seja a trilha principal. Triste engano: revelam-se apenas picadas abertas pelo gado, super fechadas, porque pouco transitadas, maior chatice percorrê-las, galhos barram o caminho e espinhos se agarram à roupa. Nada paciente, começo a me irritar com aquela galharia infernal e não vejo a hora de terminar a pernada. Após uma hora perdidos saltando dum filo a outro filo, como fala Fernando, acertamos o rumo e engrenamos lomba abaixo, avistando, finalmente, San Lorenzo e mais adiante Salta....ebaaa! Devido a outra desorientação de Fernando damos não em San Lorenzo, conforme o programado, e, sim, em Las Costas, um de seus distritos. Tadinho de Fernando, mais uma vez, se perde, nos fazendo descer por uma piramba do outeiro de La Cruz Blanca. Eu, pensando que a aventura terminara, percebo, louca de medo, que posso num vacilo despencar e quebrar o pescoço. Enfim, às 17 horas, após 14 km de pernada, alcançamos a estrada onde Pancha nos resgata. Hospitaleira, a mulher de Fernando, trouxe café (graças a deus não adoçado) e um delicioso pão feito em casa, receita de família. Estou super cansada razão por que recuso o amável convite de meu guia pra comermos empanadas regadas a cerveja preta numa bodega de San Lorenzo. Dou minha missão por cumprida e o que quero é singelo: um banho quente e caminha assistindo televisão, hehehe!

Um comentário:

Anônimo disse...

A parte de 'perdidos no bosque' foi a melhor! ahahah... A sua narrativa é a melhor parte dos vídeos! E olha que as paisagens são estonteantes, viu, Bea! Bjs! Alu