segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Retorno a Cusco

Férias se aproximando, eu retorno meu olhar pro trek ao redor do maciço Ausangate no Peru, obrigada que fui a abortá-lo coisa de 2 anos atrás devido a doença na família. Mas agora vai dar, tanto que envio os devidos emails à agência peruana que me presta assistência nesse país. E convido para ir comigo, Jucilene, Juju, a quem conhecera num pedal em terras uruguaias por ocasião do feriadão de carnaval. A guria se entusiasma com a possibilidade de incursionar em alta montanha, acontecimento inédito até então em sua vida. E, às 6:35, dum sábado, 02 de agosto, pegamos o vôo da Avianca POA-Cusco com conexão em Lima, desembarcando em Cusco às 12:35. Visitara a cidade em 2005, quando vim a primeira vez ao Peru, iniciando justamente neste país a fazer alta montanha: a famosa trilha de 4 dias até Machu Pichu. Sérgio, proprietário da agência Nuestra Montaña, (http://www.nuestramontana.com) nos aguarda no aeroporto, já com um táxi de prontidão que nos conduz a Urubamba onde pernoitaremos. Tudo pelo bem de nossa aclimatação já que esta cidade está a 2.870 metros de altitude, portanto, menos elevada que Cusco cuja altitude é 3.300 metros. Durante o caminho, uma montanha se agiganta mais e mais à medida que vamos nos aproximando de nosso destino. Trata-se do nevado Chicón, um cinco mil, pertencente à cordilheira Urubamba cujas montanhas rodeiam a pequena cidade de mesmo nome, situada no Vale Sagrados dos Incas. Nosso hotel, Amaru Valle, cujas habitações são chalezinhos com 2 dormitórios, cada um com seu banheiro, separados entre si por um corredor, arranca elogios rasgados de Juju. Cada uma ocupará um quarto para o bem de preservar a amizade. Afinal, quando se viaja em parceria, vivendo quase o dia inteiro juntas, o convívio tem de ser refrescado por pausas, não é mesmo? Ajeitadas as malas nos aconchegantes aposentos e após bebericarmos um chá de coca, vamos dar uma banda na cidade. A Plaza de Armas, distante 4 quadras do hotel, exibe o belo templo de San Pedro Apóstolo de Urubamba, com altar folheado a ouro. Tanto na Bolívia quanto no Peru, é super comum carrocinhas vendendo todo tipo de comida. Aqui não é diferente. Paro diante duma cuja oferta são ovos de codorna, cozidos e já descascados, 4 por 2 soles, acondicionados num saquinho plástico. À disposição do freguês, pasta de aji verde para temperá-los. Por certo que os comprei! Deliciosos! O dia tem estado lindo desde que chegamos com temperatura agradável a ponto de ser possível usar camisa de manga curta e short. Belas e gordas nuvens brancas se aninham no céu azulado. Fazemos um almoço-janta às 16 e 30 no surpreendentemente bom restaurante Huacatay. Tanto a truta e asopa de quinua coroada com ovo de cordona poché estavam de lamber os beiços. À noite, como toda cidade localizada em altitude, a temperatura cai, exigindo um bom agasalho. Como não há muita coisa mais para ver ou fazer na cidadezinha, sem desprezar o fato de que amanhã devemos acordar cedo prum trek de aclimatação, retornamos ao hotel. Eu pelo menos já sinto os efeitos da altitude materializados numa certa sensação de preguiça. Caminha é o que o meu corpitcho necessita. Simbora mergulhar nos braços de Morfeu!!


Domingão, Sergio vem nos buscar juntamente com mais dois guias locais, os simpáticos e falantes Joc e Max. Fazem parte do nosso grupo, três suíços e três argentinas. Embora ainda sejam 7 horas, há indícios de que o dia será estupendo. Nosso trajeto será ao longo dum trecho da Cordilheira Urubamba, uma das três existentes no Departamento de Cusco. Com 75 km de extensão no sentido oeste-leste tem como nevados principais, Sahuasiray, Veronica e Chicon, este último onipresentíssimo durante a viagem de Cusco a Urubamba. Iniciamos a pernada às 8 da matina pela quebrada Pumahuanca, cujo tradução do quéchua significa “o uivo do puma”. A vegetação compõe-se de bosques tropicais andinos entremeada pela presença de eucaliptos, introduzidos em território peruano no século XIX. À medida que ganhamos altitude, a exuberante vegetação cede lugar a vastas campinas ocupadas por arbustos de pequeno porte e ichu, uma espécie de gramínea típica dos altiplanos andinos cuja utilidade é dupla: serve de pasto para lhamas, alpacas e vicunhas bem como cobertura usada nos tetos das casas dos pastores. Já na cota dos 3.500 metros, avista-se, no fundão do vale, a cidadezinha de Urubamba abraçada por uma enfiada de montanhas em seu entorno. Os suíços exibem sua boa forma física e logo tomam a dianteira do grupo (como nós, eles também estão se aclimatando antes de enfrentar o nevado Pisco, pertencente à Cordilheira Blanca, na província de Huaraz). Não há como segui-los até porque são uns perna-longas! As argentinas, exceto Soledad, totalmente sem noção, usam mochilas, roupas e calçados inadequados. Com excesso de peso, todas andam sem bastões, e de cara, duas vão ficando pra trás, tocando ao guia Joc lhes fazer companhia. Nos pontos de parada, as duas demoram bem uns 10 minutos pra alcançar o resto do grupo. Claro está que não completam o percurso, desistindo lá pela metade do caminho e retornando ao ponto de partida. Já Juju, embora seja sua primeira experiência em altitude, tá mandando bem. Caminha despacito, sem contudo parar, a não ser pra fotografar, por supuesto. Ao cabo duma boa subida onde se vê a ponta dum nevado, deixamos Pumahuanca para trás e entramos noutra quebrada, a Sutok. Pequenas quedas d’água formadas por ribeirões cortam a paisagem cujos contornos adquirem tons mais secos em termos de vegetação. Algumas casas bem rústicas feitas com pedras e tetos de palha servem de moradia aos proprietários de lhamas e alpacas. Contou-nos Joc, no início do trek, que foi criada em Urubamba a organização não-governamentel Lhama Pack resgatando como animal de carga estes camelídeos, tão ao gosto dos incas antes de os espanhóis terem invadido o continente sulamericano e introduzido os equinos como meio de transporte e tração a partir do século XVI. O bolo da cereja do trek é atingir a cota dos 4 mil metros e, quando lá chegamos, os suíços fazem questão de que troquemos beijinhos de congratulações. Nunca imaginei que essa gente fosse tão afetiva e simpática! Terminada a pernada, retornamos todos - exceto Max e Joc que vivem em Urubamba - a Cusco onde chegamos às 18 horas. Largamos as malas no hotel - muito bem localizado, a somente 3 quadras da Plaza de Armas - e nos mandamos em busca dum bom restaurante onde jantar. Brindamos à nossa boa aclimatação, Juju bebendo suco de maracujá (a guria ainda está em tratamento com antibiótico) e eu degustando um saboroso malbec-merlot peruano de sugestivo nome Tavernero. Que vengam los 5 mil!!!


Na segunda-feira, decidimos dormir até a hora que nos dá na telha. Claro está que não passo das 9 da manhã. Nem bato no quarto de Ju, desço sozinha ao refeitório e quando estou quase terminando meu desaiuno minha parceira aparece. Comento que sinto minha cabeça um pouco dolorida. Ela responde que nada sente. Invejável aclimatação a dessa guria, ala putcha! Vamos juntas às compras já que pretendemos ambas adquirir roupas de montanha. Ju se lava comprando jaquetas, calças, blusas, bastões e garrafas térmicas. Detalhe: quase tudo fake, por supuesto. Porém, o que importa é que cumpra o objetivo de protegê-la do frio da alta montanha. E isso os produtos fakes fazem muito bem! Ju que antes de chegar a Cusco tinha me garantido que não iria gastar muito (me engana que eu gosto,
hahahaha) perde a cabeça e enlouquece comprando xales, chaveiros, máscaras, presépios, bonecas, toucas, imãs de geladeira, cobertas, miniaturas de lhamas, enfim, um arsenal de bugigangas a que turista algum resiste quando vê exposto nas lojas. O dia está delicioso com céu azul manchado aqui e ali por rechonchudas nuvens brancas. Quando estamos diante da Plaza de Armas, nos preparando pra fotografar a catedral e a igreja da Companhia de Jesus, estaciona diante da calçada um daqueles ônibus turístico com 2 andares, oferecendo por 20 soles um rolê pelo centro histórico e adjacências. Convenço Ju a desistir temporariamente de suas investidas nas tiendas cusquenhas e embarcamos no busão. Durante uma hora e meia, encarapitadas no 2º andar do veículo, fotografando enlouquecidas até fios de eletricidade, vemos desfilar as estreitas vielas da cidade histórica, com breve shop stop numa lojinha de artesanato. Juju feliz da vida arremata dúzias de pequenos objetos (cá com meus botões, acho que até o porteiro do edifício fronteiro ao dela vai ganhar lembrancinha peruana). Nova parada, dessa feita, num mirador, situado no alto duma colina, de onde se tem uma visão panorâmica de Cusco bem como da nevada face norte da montanha Ausangate. No retorno, passa-se ao largo do sítio arqueológico de Sacsayhuaman, sem, contudo, se descer do busão.  Estamos eu e Juju revoltadíssimas com a internete, péssima no hotel, e sofrível no restante da cidade. Como o real está custando praticamente o mesmo valor dum sol, o Peru não está lá muito barato, não. Uma refeição com uma taça de vinho não sai por menos de 40 reais. À noite esfria e o céu torna-se estreladíssimo, já dando pinta uma lua crescente que se tornará cada vez mais gorda noite após noite. Uhuuuu, vai ter lua cheia daqui a 4 dias! E, amanhã, inicia o nosso trek de 6 dias ao redor do nevado Ausangate.....ebaaaa!!!!

Um comentário:

Miriam Chaudon disse...

Que bom, amiga! Montanhistas têm uma vida feliz! Lhe desejo muitas lindas montanhas em sua vida!