sábado, 9 de agosto de 2014

Experiência infernal

O dia mais frio de todos embora sem queda de neve durante a noite. Ju continua debilitada da infecção intestinal motivo por que deixa o acampamento montada a cavalo. Hoje a pegada é fodástica porque temos 2 passos a enfrentar: Apachata e Arapa. O primeiro situa-se na montanha situada diante do acampamento da laguna Ausangate. Apesar de curto - a distância ultrapassa pouco mais de 1 km -, o ascenso é bem íngreme até os 4.900m de seu topo. E começa a nevar enquanto estamos subindo! De novo, oh, não!! Ultrapassado o passo cujo solo exibe-se bastante nevado, imersos numa nuvem, penetramos no belíssimo Pampachiri, um estreito vale delimitado à direita pelo extenso maciço do Ausangate e à esquerda por cordões rochosos que, em certos trechos, se afunilam formando algo parecido com o que aqui no sul chamamos de brete. Muito a fudê essa parte do vale. Passamos ao largo da laguna Vinococha cujas águas azuladas são bem escuras. Nesta banda, já estamos diante da face oeste do Ausangate onde, não muito distantes de seu cume, penduram-se enormes seracs. Uma pena a maior montanha do departamento de Cusco se encontrar parcialmente encoberta por nuvens. A merda do tempo mais uma vez nos sacaneia! Pois não é que o céu tem se mantido nublado já faz 3 dias? Merrrdaaa!! Passamos por três lagunas, todas chamadas Pucacocha, resultado do degelo dos glaciares que cobrem parcialmente o Ausangate. A escassa vegetação, constituída praticamente por ichus, imprime à paisagem uma paleta de cores que se reduz ao amarelo das gramíneas e ao cinza escuro das rochas. Almoçamos em frente ao Extremo Ausangate, um monolito de coloração preta, também parte integrante do maciço Ausangante. Turistas que pretendem escalá-lo estão acampados aqui. Daniel avisa que, embora “suave”, a subida até o passo Arapa demora um eito em razão de ser super longa sua travessia. A partir daqui, a paisagem vai se tornando cada vez mais árida, aberta, sem montanhas próximas que a confinem. Na verdade, alterna trechos “planos”, com pequenas elevações que lembram um pouco as coxilhas gaúchas. Cansada como estou qualquer lombinha significa um evereste pra mim, motivo por que um pouco antes de alcançar o passo Arapa, chego à conclusão que será tortura insistir em continuar caminhando. Tenho a impressão de que se der mais 10 passos, desabo no chão. Ju então cede o cavalo pra mim, a querida. Tamanha a exaustão que mal consigo montar no lombo do manso animal pra enfim alcançar “motorizada” os 4.800 metros do passo Arapa. Deste ponto em diante, novamente, o Ausangate volta a exibir sua face norte, e nós completamos assim uma volta de 360º ao redor desse formidável maciço. A paisagem torna-se totalmente desértica, sem qualquer talo de gramínea. Já recuperada, apeio do cavalo e vou caminhando até o acampamento armado em Upis. Na descida, rebanhos de alpaca pastam numa área onde a vegetação rasteira dá pinta novamente. Chegamos a Upis às 14 e 20 após 6 horas de pernada numa distância total de 15 km. Eu e Juju, felizes da vida, com a possibilidade de relaxar nas águas termais, pegamos a trilha que conduz às piscinas. Quando entro, solto um formidável berro que deve ter sido ouvido em Cusco. A água não está quente, está fervendo, está pelando!!  Um horror!! Fico, inclusive, sem ar por alguns segundos, tamanha a violência do choque térmico. Espero seja esta a única experiência infernal sofrida não só em vida como na morte, hehe. A sorte de Juju é que ela não entrou comigo. Passamos as duas então pra outra piscina. No entanto, a temperatura morna da água não convida a que fiquemos nem 10 minutos ali. Outro martírio é enfrentar o rústico vestiário cujas janelas sem vidro não nos protege nada das frias rajadas de vento que fustigam o lugar. Como a face norte do Ausangate ainda está escondida pelas nuvens, sem chances fotografá-la. Oxalá, amanhã o dia esteja melhor! Entro na barraca e ponho pra carregar meu relógio Garmin no recharger Sherpa 50 adquirido recentemente. Uma maravilha essa engenhoca! Nem precisei usar os painéis solares porque o recharger, carregado previamente na eletricidade antes de sair pro trek, só consumiu 20% de sua capacidade de armazenamento. Nunca mais vou ficar na mão sem poder registrar o trajeto de minhas aventuras, coisa que antes não conseguia porque o Garmin só agüenta 7 horas por dia. Posso agora ficar no mato sem cachorro mas never nunquinha mais máquina fotográfica, ipod, celular e relógio me deixarão na mão, sem funcionamento, por falta de carga!! Viva a modernidade uhuuu!! Deito-me e pego o livro de suspense que se desenrola na Lapônia norueguesa “40 dias sem sombra”, cujo nome se deve aos largos períodos em que ausente a luz solar naquela parte do hemisfério norte. Tá aí um lugar que quero conhecer, não só por isso mas pelo espetacular fenômeno da aurora boreal. 

Um comentário:

Miriam Chaudon disse...

Águas termais ou infernais, Bea?! Hahahaha! Que baita susto!